terça-feira, 13 de agosto de 2024

13 DE AGOSTO, DIA DE SANTA DULCE: NOVOS TEMPOS.

 

Itabaiana de todos os santos em Dia de Santa Dulce
(esq. para a dir.: Santa Mônica; Santo Agostinho e Santa Dulce. Os dois últimos em mirantes com bela visão da cidade)

Hoje, 13 de agosto, dia do psiquiatra, do canhoto e do desgastadíssimo economista, é também o Dia de Santa Dulce, que realmente tirou Santo Antônio do protagonismo católico total por aqui. Apesar de continuar o maior, até mesmo porque a mesma Santa Dulce foi, antes de tudo, uma devota de Santo Antônio. Porém, com o protagonismo atual, assumido pela santa baiano-sergipana, o santo dos santos lusitanos, como advertiu, tempos atrás o articulista, Jerônimo Peixoto, deve estar sentindo um pouquinho de incômodo, aqui na cidade de Santo Antônio de Itabaiana. Esclarecendo o baiano-sergipana: Maria Rita nasceu na velha cidade da Bahia; porém, a freirinha Dulce, nasceu de Maria Rita na cidade de Sergipe d’El-Rei - São Cristóvão - que nesta semana também nos deu uma campeã olímpica: Duda, do vôlei de praia, em Paris.

Itabaiana, de fato, ao menos pelos mandarins, nunca foi assim tão fiel a Santo Antônio; apesar de ter há quatro séculos ter de se render à sua força.

A entronização do santo, provavelmente influenciada pela ordem franciscana, documentalmente ocorreu na década de 1620, quando foi iniciada a primeira capela em terras itabaianenses – a hoje, em ruínas, Igreja Velha.

Mas as autoridades não lhe deram condução; e, depois da baita confusão de 1656, em 1665, nove anos depois, o padre de Sergipe – todo o estado era município e paróquia de São Cristóvão – Sebastião Pedroso de Góis, lá criou a Irmandade das Santas Almas do Fogo do Purgatório. Dedicada a São Miguel Arcanjo, atualmente representado por sua imagem no altar da matriz de Santo Antônio e Almas.

Porém, quando com poderes plenipotenciários chegou a Itabaiana, em julho de 1674, o governador das minas, D. Rodrigo de Castelo Branco, com ordens de fundar uma cidade clássica (Muros, fosso, ponte, torres, canhões, soldadesca, e obviamente, uma matriz e casa de câmara e cadeia), o Padre correu aqui, arranjou um sítio, vendeu à Irmandade das Almas e fundiu Santo Antônio, do povo, com São Miguel, sua preferência. Nem a cidade foi construída como pensada – não houve prata que justificasse - nem o povo se dedicou devidamente a São Miguel.

Centenas de anos depois, no furor modernista da nova capital, e sua padroeira, Itabaiana tentou turbinar a devoção a Nossa Senhora da Conceição. Até sua velha Filarmônica Euphrosina, originada do coro sacro, criado pelo profícuo Padre Francisco da Silva Lobo, foi rebatizada com a onomástica que ainda hoje possui. Mas Santo Antônio resistiu.

Em 1954, pela Lei Municipal 119, de 8 de março, finalmente foi oficializada a tradição tricentenária de comemorar no 13 de junho o santo, que originalmente denominou a cidade: Santo Antônio de Itabaiana.

A Lei Orgânica do Município consolidou o feriado no seu artigo 189, das Disposições Transitórias.

Mas ora, vivemos tempos agitados.

A cidade se consolidou como capital regional; dobrou de tamanho nas últimas décadas. 

Com o advento dos condomínios fechados, de médio e alto padrão, segurou sua classe mais abastada, em geral em contínua fuga, especialmente para a capital, repercutindo nos serviços e melhoria geral.

Simbolicamente, o primeiro condomínio de alto padrão, construído à margem da antiquíssima estrada real de São Cristóvão, por onde passou D. Rodrigo de Castelo Branco e o Padre Sebastião Pedroso de Gois para instalarem a paróquia de Santo Antônio, núcleo de origem da cidade de Santo Antônio de Itabaiana, foi batizado de Santo Antônio. O segundo, homenageou indiretamente Santa Clara de Assis, mas os terceiro e quinto empreendimentos homenagearam mãe e filho: Santa Mônica e Santo Agostinho, doutor da Igreja, e em cujos fundamentos ela evoluiu institucionalmente.

Nenhum dos dois é popular, como bem observa Antônio Samarone em recente artigo; porém, na minha concepção, a cristandade – inclua-se aí quase todos os não católicos – tem enorme dívida de gratidão com o bispo de Hippo-Regius ou Hipona, atual Annaba, Argélia. Deu régua, compasso, prumo e nível ao pensamento cristão, então disperso, ainda cheio de lacunas depois de Niceia. Tenho-o profunda admiração. 

A minha bucólica Mangabeira, em 1995, (atualmente se acha urbanizada) rodeada de serras, lembra as serras que circundam as ruínas da velha Hippo Regius, hoje Annaba, e a basílica de Santo Agostinho, abaixo.


Se há um local que deseje visitar longe das minhas serras, é o que está entre as serras, à beira-mar, no Mediterrâneo, que circundam a catedral da muçulmana Annaba. Talvez por me lembrar a paisagem de tenra idade na minha Mangabeira, povoado em que nasci, ao sul do município de Itabaiana.

Santa Dulce, começada a ser oficialmente santa em Itabaiana, está em franco crescimento entre nós.

Tão logo nos livramos da maldita pandemia, começou-se a preparar um lugar digno dela, o mais digno que se pode oferecer, que é o coração do itabaianense. 

O Caminho de Santa Dulce, de Itabaiana a Salvador, foi estabelecido pela Associação Sergipana de Peregrinos, já no ano passado. A versão doméstica do mesmo, organizada principalmente pelo pessoal do Abrigo Santa Dulce, além de providenciar a estátua da santa num mirante, nas dependências do referido Abrigo, na zona urbana, inaugurou a ermida fronteiriça ao Parque dos Falcões, local histórico brasileiro, onde nasceu a Lenda da Prata de Itabaiana, na vertente sudoeste da Itabaiana-açu. Para ali tivemos no último dia quatro, a segunda e concorridíssima caminhada com milhares de fiéis, só menor que a emblemática procissão de Santo Antônio, multissecularmente realizada todos os dias 13 de junho.

Enfim, Santa Dulce veio para ficar.

E, já que em vida foi devota de Santo Antônio... já acho que quem mais uma vez vai sobrar será o pesador de almas, São Miguel Arcanjo.