sábado, 7 de abril de 2018

Quando prenderam Chico de Miguel: um golpe que não deu certo.



Francisco Teles de Mendonça, Chico de Miguel, 1926-2007, foi o segundo mais longevo líder político em Itabaiana e primeiro a sê-lo de modo ininterrupto. Entrou na política ainda novo, na condição de cabo eleitoral de Manoel Francisco Teles, coronel da política local pelo PSD, mas logo com ele se desentendo e se desvinculando, passando a acompanhar seu opositor, então recém egresso, Euclides Paes Mendonça, da UDN, se tornando do primeiro time do intrépido neo-coronel.
Em 08 de agosto de 1963 assassinam Euclides, então deputado federal, e seu filho, Antônio de Oliveira Mendonça, deputado estadual, e, a viúva, viu-se com o poderio na mão e um monte de lobos famintos querendo pega-lo. Entregou a Chico.
A primeira eleição após 1964 foi em 1966, menos pra presidente, uma manobra do já todo poderoso Roberto Marinho, dono do jornal, rádio e então nascente TV Globo, junto ao governo americano, fiador do golpe de 64, como do de agora. Em Sergipe, e em Itabaiana em particular, manobraram as candidaturas, de forma a contentar gregos e troianos, desde que não aliados dos perdedores com o golpe. Chico saiu candidato a deputado estadual, obtendo 3202 votos, sétimo mais votado; o prefeito eleito foi Vicente Machado Meneses da antiga UDN, e o vice, Derivaldo Queiroz Correia, do antigo  PSD, ambos agora no mesmo partido: a ARENA.
Mas, em 1967, mataram Manoel Francisco Teles, então quinto suplente (1783 votos) de deputado estadual pela mesma ARENA de Chico, jogando a culpa sobre este. Nunca foi provado; contudo diante das cobranças de manutenção da ordem feitas por Brasília encarceraram Chico e retiraram-lhe o mandato.
O xeque-mate viria nas eleições de 1970 com Chico preso, e seu partido lançando candidaturas sem sequer notificar-lhe oficialmente. Naturalmente que de adversários seus que estavam no mesmo partido, pondo como candidato a vice-prefeito um partidário seu pra enrolar o eleitorado; manter as aparências.
O MDB não existia; era só pra constar. Os alfaiates e comerciantes, José Filadelfo Araújo e José Hênio Araújo, pai e filho eram suas maiores expressões. Os párias da política local, motivo de chacota. Sem chances. Boatos de que não podiam registrar a chapa e uma certa má vontade dos agentes públicos, discretamente foram driblados pela responsável naquele ano pelo Cartório Eleitoral. Ninguém dos pre-vitoriosos foi veemente em estranhar, porque o “velhinho 70” não tinha chance. Riram.
Ocorre que Chico, pouco mais de quatro anos depois já era líder. Visitado na Penitenciaria Estadual pelo ex-deputado federal, José Carlos Teixeira, comandante do MDB estadual, com este acertou o apoio a José Filadelfo Araújo, que venceu “os doutores”. A eleição teve 32 por cento de abstenção, e quase 10 por cento dos votos foram anulados, perfazendo 40 por cento; mas o “velhinho 70” levou com folga.

A CAMPANHA DO MDB

Como disse acima o registro da chapa já foi meio clandestino. A campanha também. Apenas um comício, pequeno; impressos, nenhum; mas a rede de informações funcionou maravilhosamente bem.
Em casa, na zona rural – sítio, como se diz por aqui – sem energia e noite quente, fui dormir logo cedo, numa rede na varanda. Por volta das oito e meia ou nove da noite, um carro, coisa raríssima naqueles tempos e lugares zoou na ladeira, uns 800 metros distantes. Sono ainda leve eu ouvi e acompanhei a evolução do barulho do motor, e agora também da luz entrando por dentre o frechal e o telhado, em aproximação constante. Parou em frente ao portão da minha casa. Ao aproximar dos ocupantes do jipe – pelo barulho do motor deu pra perceber – meu pai, no quarto dele, pigarreou. Ao chamarem à porta, meu pai acendeu o candeeiro e perguntou quem era. A voz nasalada, e inconfundível do vereador, amigo de meu pai de longa data, Olímpio Arcanjo de Santana se fez anunciar. Meu pai abriu a porta, convidou-os a sentar e começou o diálogo:
 - Alexandre, eu venho da parte de compadre Chico – disse Olímpio – ele está pedindo a todos os amigos que votem em Seu Filadelfo, alfaiate e homem de bem!
Meu pai indagou porque Seu Filadelfo, que era de outro partido, ao que Olímpio reforçou:
- Não é do nosso partido, mas é homem de bem. Esse outro que apresentaram aí não é nosso amigo.
Em 15 de novembro, meu pai arrebanhou os quase cem eleitores que o seguiam. Eu vim com ele e minha mãe. Um corredor de mais de 500 metros, até o local de votação nos esperava: soldados do Exército, armados de fuzis com baionetas. Terminou a eleição, veio a contagem dos votos e a surpresa pros sem noção.
O homem é um ser político. Por mais que hajam demiurgos querendo provar o contrário.