quinta-feira, 19 de setembro de 2024

O PREÇO DE UMA ELEIÇÃO.

“Se você é um candidato, não deve proporcionar refeições às pessoas para incentivá-las a votar em você. E, se o oferecer por outros motivos, elas não devem passar de nove pessoas.”

(Posturas eleitorais romanas, nos milhares de municípios do Império, por nos séculos I a III da Era Cristã)

Herdeira do maior e mais bem sucedido império que a humanidade já vira, Roma também a era, do duro aprendizado da sociedade humana, desde os sumérios e egípcios, de quatro mil anos antes, aos persas, gregos, fenícios, judeus e cartagineses, contemporâneos, ou por Roma absorvidos.

E, como não era um governo absolutista, Roma se baseou na lei para todos. E, óbvio, para segurar os avançadinhos nas disputas eleitorais.

Ora estamos em mais um certame eleitoral, que deverá, para pior ou para a melhor, escolher aqueles que nos regerão pelos próximos quatro anos. Desde o alcaide, sucessores do primeiro, João da Costa Feyo, e modernamente chamado prefeito; aos velhos componentes dos conselhos municipais, na Grécia antiga, ou sofisticado por Roma - os vereadores - de quem nunca soubemos os nomes dos primeiros de Itabaiana, em 1697.

Nestes tempos de internete, com tudo acelerado e facilitado, desapareceram as bandinhas de música, usadas massivamente, e pela última vez, por José Queiroz da Costa, quando candidato a prefeito em 1992, hoje substituídas integralmente por espalhafatos e abusivos paredões, levemente contidos pelo Judiciário e suas ameaças pecuniárias de até dezenas de milhares de Reais. E só assim funciona. Mexendo no bolso.

Outro recurso propagandístico, a distribuição de “santinhos”, anda bem tímida; e me parece que desestimulada.

Neste ano eu resolvi, à medida do possível, colecionar “santinhos”.

De uma ala, até o momento só consegui dezenove exemplares; da outra, nem isso. Aliás, muito menos que isso. Ou é marcação com o bairro em que resido, ou é modicidade mesmo; uma vez que a onda agora são as redes sociais; que, como ondas de rádio, postou, logo acabou. Todavia, como agora tudo é super rápido, são as elas os espaços da vez.

Outra coisa que me chama a atenção é o clima de descompromisso dos distribuidores de tais materiais.

Em eleição dá de tudo.

Alguém me soprou ao ouvido, alguns anos atrás, que um conhecido político tinha muitos filhos, frutos de campanha. E não é que o danado me confessou, pessoalmente, que, incialmente foi uma estratégia para ganhar votos? 

Foi numa época em que ainda imperava os controles familiares (todos votavam em quem o cabeça mandava), e as famílias costumavam serem imensas, e ainda por cima a votação que elegeria um vereador ficava na casa das duas centenas de votos para menos. O controle de quatro famílias, mediante entrada, mesmo que discutível, nelas, já garantia metade da votação.

Hoje, com famílias atomizadas, reduzidas e incontroláveis, os meios são outros.

Mas a contratação de uma multidão para trabalhar na campanha, ainda supostamente renderá alguns votos. Além, claro, de mostrar força e viabilidade do candidato. 

Talvez. A julgar pela empolgação dos distribuidores de “santinhos”.

quarta-feira, 18 de setembro de 2024

A ERA DA FALSIDADE

 “...com aquele sorriso, falso igual a beijo de rapariga”

(Jersier Quirino, O Barbeiro)

Os líderes buscavam serem confiáveis. Darem segurança. Os pretensos de hoje... abrem os dentes.
Desde 1978, que guardo na mente os versos do trabalho de Ednardo, em Receita da Felicidade, publicado no LP, O Azul e Encarnado, pela RCA Vitor, em 1977, logo após o estrondoso sucesso de Pavão Misterioso, esta, trilha da novela Saramandaia, da Rede Globo, proibida pela Censura da Ditadura, no Governo Geisel, única vez na vida que o governo brasileiro governou em plenitude, peitando inclusive a Rede Globo, poderoso instrumento de dominação “softpower” do Departamento de Estado americano, no Brasil, obviamente.
A música do Ednardo é uma crítica à manipulação publicitária, com o uso (abuso?) de crianças.
E, de falsidade em falsidade, chegamos aos candidatos do certame eleitoral atual. Os das últimas três décadas, especialmente. E seus sorrisos.
Ao se posicionar à frente de uma câmera para uma foto, quase sempre com o ponteiro do ‘vaidômetro’ batendo no limite, contudo, para uma campanha eleitoral o cidadão ou cidadã buscava passar a imagem de pessoa séria, compromissada, um ou uma líder de verdade. Depois que todos se convenceram que a política, o governo e até o Estado, são circos, todo mundo virou estrela de circo. No pior sentido, por favor. Seja o tradicional, seja o mais moderno, conhecido como influencer, influenciadores, na língua que ainda é a do Brasil.
Nada daquela seriedade, de quem, compenetrados, os candidatos entendiam a importância, o alcance e peso de carregar sobre as costas a responsabilidade de guiar os destinos do seu grupo, do seu município, estado ou federação deles. 
Todo mundo tem de abrir os dentes, fechando corações e mentes, ao progresso da civilização. 
O espetáculo deprimente que assistimos nesta semana entre dois palhaços, no pior sentido (um vindo do show de horrores dos programas policiais, o outro, um influenciador de internet), gerado por esse sistema perverso, espetáculo tido pela maioria como natural, é o coroar do fim da civilidade. Queira Deus que passageira.
Porém, a constatação é óbvia: o ‘deep power’* (poder profundo), desgraçou, matou a mística de todos os líderes políticos. E a nossa geração lhe seguiu, foi por ele conduzida, abrindo caminho aos tiranóides. Os minimamente controláveis, tipo Collor e Bolsonaro, que até presidentes já foram; e Pablo Marçal, que, temo, sê-lo-á, em breve.
E quase nada tem para se colocar no lugar.

*corruptela de 'softpower', anglicismo, hoje generalizado no jornalismo brasileiro, que nunca foi tão colonial quanto hoje.