sábado, 22 de junho de 2024

XAXADO, ‘OI’ EU AQUI DE NOVO!

 

“Não tem carranca/

Nem trator, nem alavanca/

Quero ver que é que arranca/

Nós aqui desse lugar” 

(Chico Buarque, A Violeira)

 Anunciaram que agora o São João acabou. Acabou o forró, substituído por essas esquisitices que a “mass media” apelidou de sertanejo, no qual não se ouve batidão, catira, guarânia, etc.; até funk (Suassuna deve estar se revirando no caixão). E sabe, São João sem marchinha, xote, baião, xaxado e mesmo toada, convenhamos: não é São João! No caso das marchinhas mesmo, as mais executadas nas quadrilhas, desde a década de 1950 são a do ítalo-paulista Mariozan e do Rei do Baião, Luiz Gonzaga.

Mas nesse Brasilzão dos últimos moralismo seletivos da politicalha e outros ignóbeis ismos, o esquemão resolveu enterrar os ritmos nacionais, a maioria com raízes nordestinas; deste Brasil profundo, vetusto, por estrangeirismos repaginados. E ele veio com tudo. Pra “reinventar” o Brasil.

Em 1930 o Brasil mergulhou na era do rádio, de forma periférica. 

A invenção do rádio é brasileira; mas foi um inventor na Itália super queridinha da mega potência da época – a Inglaterra, e sua geopolítica de isolar França, Alemanha e a já claudicante Áustria – que levou a melhor. No Brasil só se pensava em plantar e exportar café, sendo proibido qualquer coisa disso destoante. O inventor do rádio é o italiano Guglielmo Marconi e fim de papo. E o Brasil como periferia sub-do-sub entrou na era do rádio.

Entre 1925 e 1940, musicalmente o Brasil se debateu entre o estrangeirismo deslumbrado de suas elites com polcas, tangos, mazurcas, valsas e mais qualquer coisa que soasse “civilizado”, aceito pela Europa rica; no mínimo sendo moda em Nova Iorque nos ainda “brega” Estados Unidos. Do Brasil, só o samba carioca, meio marginal, com cara de guerrilha.

Em 1942 o Brasil aprofundou as relações com os Estados Unidos, consolidando a dominação estadunidense sobre a América Latina, inclusive com o imenso uso do soft-power (poder suave) americano das comunicações, música e cinema, especialmente. Com o rádio essa não mais seria uma reaculturação somente das elites com nos outros 450 anos da História do Brasil, sempre a imitar, sucessivamente a Espanha e depois a Inglaterra; o povo passou a também ser foco. Seria a morte da brasilidade.

Seria.

Em 1941, antes do pacotaço americano, depois de uma provocação de um cearense, Armando Falcão, futuro ministro da Justiça de Geisel, na ditadura, Luiz Gonzaga resolveu cantar o que gostava: a riquíssima música do Nordeste, baseado nos cantos populares, resultante da secular mistura de lusitanos, judeus, ciganos, mouros, os variadíssimos povos escravizados da África preta, de uma riqueza cultural impressionante, e dos indígenas. 

Seu “esquenta”, com o ‘Vira e mexe” mudou tudo. Não demorou e a elite paulistana perdeu a vergonha de também executar no rádio a maravilhosa música caipira; o samba carioca ganhou um fortíssimo aliado para mais se projetar. E, somente a primeira onda do rock – a chamado era do iê-iê-iê – turvou um pouco a brasilidade que, quando recobrou a força trouxe a onda de fins dos 60 e toda a década do 70, com monstros como Elis Regina, Milton Nascimento e sua turma mineira, e por aí vai. E, de algum modo tudo, toda a resistência começou pra valer naquele “Vira e Mexe” do cabra de Exu, “fi’” de Januário e Santana.

Passada a primeira onda o forró entrou em estado de decadência. Mas no Nordeste, de onde se originou e gerou seu maior embaixador, ele resistiu por anos, até ser repaginado e voltar, mais diversificado e maduro.

Coube a um itabaianense do Pé do Veado, Albino Silva e sua Rádio Liberdade de Sergipe a primazia de agregar as poderosas falanges da resistência, mormente na dupla Clemilda e Gerson Filho e seu antológico programa Forró no Asfalto, campeão de audiência em todo o Sergipe rural; então 80 por cento de sua população do estado.

Aracaju se transformou, ao lado de Campinha Grande e Caruaru, na Meca dos cantores de forró, mesmo dos poucos que continuaram no Sul, no pico da onda Iê-iê-iê, quando por cá apareciam. 

Na capital sergipana nasceu um dos hinos do forró, do cérebro poético de Anastácia, aproveitando a excelente melodia do habilidosíssimo Dominguinhos: “Tenho sede”.

Nos anos 1980 o forró andou em baixa, representado pela abusiva música de duplo sentido, engraçadinha, mas ordinária, e sempre cansativa.

Reagiu com o aparecimento de nova safra de cantores e especialmente de compositores, do naipe de um Petrúcio Amorim, porém vem sofrendo o assédio, dessa vez supostamente político-ideológicos, de ritmos não nacionais, e que nem estrangeiros são. Construções trabalhadas exaustivamente na mídia, e que vem tomando o próprio mercado típico das festas juninas que é o forró, sufocando seus guardiães.

Mas a resistência continua. Ao menos na Itabaiana de Albino Silva, de Mamede Paes Mendonça e de seu sobrinho, no Recife, outra cidadela, aliás, a mais representativa, apesar dos escorregões.

Hoje, sábado, dia de feira, há 162 anos, ao menos em quatro lojas comerciais, houve uma trio pé-de-serra clássico – eu vi com esses dois olhos que a terra há de comer - a entoar clássicos recentes e antigos. Bem animado.

E, durante a semana que passou, várias unidades educacionais primárias, especialmente, no município contratou um trio desses ou semelhantes para animar as inúmeras quadrilhas de alunos. A escola cumprindo integralmente seu dever em educar. Duas delas, na última quinta-feira, 20, não puderam se fazer representar no Simpósio promovido pela Secretaria Municipal de Cultura de Itabaiana, e apresentado pelo comunicador Paulo Correa, durante todo dia, sobre o forró: estavam em preparação e execução da quadrilha junina dos seus alunos. Com algum trio pé-de-serra.

Ninguém arranca nós aqui desse lugar.


sexta-feira, 21 de junho de 2024

87 ANOS QUE VALEM SÉCULOS.

 

"Fica sempre um cheiro de perfume nas mãos que oferecem rosas; que sabem ser generosas".

Se no momento estivesse entre nós, ontem teríamos apagado oitenta e sete velinhas e cantado os parabéns à mui digna lusitana-brasileira, Irmã Luciana.

Mas a inexorável flecha do tempo eternamente nos cobra o preço da magia da vida, tornando esta mais lenta nas ações, conforme, velozmente continua seu curso eterno. E a queridíssima benfeitora já não goza da mobilidade que sempre a caracterizou, desde suas artes infantis na sua bucólica Arouca, onde nasceu em 20 de junho de 1937, passando pelos vários estágios da longa vida de serviços cristãos, desde a subida às nossas serras em 14 de maio de 1972, ao último empreendimento entre nós, a ONG, Oficina Mãos Abertas Nossa Senhora de Nazaré, na localidade da Moita Formosa, hoje parte do Bairro São Cristóvão, zona leste desta cidade de Itabaiana.

Para não muito me alongar, desejo mais longos anos de vida e saúde a essa que, sem rasgação, é uma segunda mãe para mim (coincidentemente, 19 dias mais nova que a minha velhinha), como também para muita gente que em seu caminho tem guiado para melhores caminhos.

Um abraço à Arouca e familiares da nossa querida obreira; e que cuidem bem desse magnífico tesouro, enquanto permanecer sob suas guardas; e nos devolvam assim que possível.

Meus parabéns, Irmã Luciana Correia Quaresma!

Nos 80 anos, em 2017, com a presença de alguns dos encaminhados, espiritual e até materialmente; um deles, o Padre Hélio, pároco de Nossa Senhora das Graças, comunidade dos Joseleitos, no Bairro Mamede Paes Mendonça, norte da cidade.

quinta-feira, 20 de junho de 2024

UMA RÁPIDA VISITA À ESCOLA.

 

“Rádio Princesa da Serra fala, e Djalma Lobo abala a cidade de Itabaiana, êêê.”  (Vavá Machado e Marcolino, com Tarde Nordestina da cantora Marinalva, tema do programa do saudoso radialista e deputado, e símbolo da era áurea da emissora)

Hoje, pelo meio-dia, ao retornar das sensacionais explanações do colega radialista Paulo Correia num simpósio sobre o A Origem do Forró, etc., promovida pela Secretaria Municipal de Cultura, e que tiveram lugar no auditório do Shopping Peixoto - durante todo o dia – resolvi ver de perto a terceira sede da antológica Rádio Princesa da Serra, no mesmo Shopping instalada, curiosamente defronte de outra estrutura incomum a um Shopping, a capela onde todos as semanas, religiosa e literalmente se celebra Missa.

Confesso que a nova sede não me impressionou como aquela inaugurada no dia 13 de junho de 1978, há 46 anos, no primeiro andar do Cine Santo Antônio, cheia de seus funcionários e todo aquele frenesi, de gente entrando e saindo.

Nem mesmo tem o clima nostálgico da segunda sede, no antigo Cine Popular, do Beco do Cisco, rebatizado de Rua 13 de Maio, ainda com sua imensa discoteca de vinil, cheirando a mofo e nunca usada, depois que as trilhas digitais tomaram todo o espaço.

Aliás: nem o alcance que já teve um dia em Amplitude Modulada-AM, agora que foi convertida numa reles FM, tem.

Em lugar de redatores, apresentadores, porteiros, recepcionistas, discotecário (a minha cachaça)... hoje lá, num singelo estúdio (ainda com aquário, pouquíssimo usado), com antessala, só uma mesa, visualmente simples: jogo de microfones, o indefectível e indispensável computador e sua tela, a ser operado pelo companheiro, o veterano Sergio Santana.

A música – na rádio em geral - não mais vem em sulcos do vinil, ou trilhas magnéticas das fitas; sequer por disquetes, CD ou mesmo pendrives. Agora vem por streaming.

A locução, ou feita por algum abnegado, no 0800; por algum funcionário retardatário, saudoso dos tempos áureos do rádio; ou algum apostador na uberização do rádio. Jornalismo? Há muito que não se faz jornalismo; só releasismo, em geral, político partidário, peso pesado, na maioria.

Sobre a mãe de quase todos os radialistas agresteiros, na faixa dos 50 ou mais de idade, temi pelo seu ocaso definitivo. Nem comentei com ninguém “pra não dar azar”. E não deu. De alguma forma a clássica teimosia do “Grande Guerreiro”, José Queiroz da Costa, apesar de ter que mais uma vez a encolher, como manda esses tempos bicudos para mídias fora da internet, mesmo que ela associadas, mas a manteve viva.

A perda de alcance autônomo da Amplitude Modulada-AM, trocada pela limitada Frequência Modulada-FM, seria perdida de qualquer forma; velozmente, a partir do domínio absoluto do hiper oceano da internet, fazendo tremer até um Sistema Globo, hoje completamente híbrido e integrado.

Ao menos, a marca inspirada pela professora, D. Lourdes Oliveira, esposa de Mozart Fonseca Oliveira, um dos sócios originais, qual seja “Rádio Princesa da Serra”, permanece.

Curiosamente o pequeno estúdio foi parar justo no local da primeira antena de transmissão, e dentro do empreendimento, que, como a Princesa em 1978, é também um marco da ousadia Itabaianense.

Que a parceria perdure e dure a união desses dois símbolos.

Minha escola de comunicação está salva.

terça-feira, 18 de junho de 2024

ITABAIANA RUMO AOS 350 DE FUNDAÇÃO - ECOS DO PASSADO.

 

As perdas de São Miguel.

1ª parte. As presepadas de São Pedro.

Quando Jesus andou na terra, logo escolheu 12 apóstolos que o seguiram, um, porém, Simão, a quem ele apelidou com uma palavra latina, não judaica, Pedro, passou a ser seu predileto. O nome “Pedra”, era justo porque Petrus seria a pedra, a rocha fundamental na sua obra.

Certo dia Jesus teria perguntado a Pedro o que gostaria que lhe desse quando fosse ao Céu. Ao que Pedro, na sua simplicidade e sinceridade teria respondido: “quando eu lá chegar, Senhor, eu quero que o senhor me deixe onde eu me sentar primeiro.”

Promessa feita, tempos depois, Pedro, crucificado de caça para baixo em Roma, sobe ao Céu.

Desde o princípio dos tempos que o porteiro do Céu era o todo-poderoso e à toda confiança do Eterno, o arcanjo São Miguel. Ao bater à porta, São Miguel que já antevira a sua chegada, ritualisticamente abriu uma fresta, e perguntou quem aí estaria, mesmo sabendo de quem se tratava. Até aí, tudo bem; só que Pedro, desconfiado com os novos ares, pôs a mão na portada, impedindo o fechamento da porta, ato necessário à completude do ritual de recepção de uma nova alma: a conferência, por fresta; fechamento da porta, enquanto ia conferir a documentação; e por fim, a completa abertura e ingresso do recém chegado ao Paraíso.

Ao tentar fechar a porta para a segunda parte do ritual de recepção, São Miguel colheu o protesto de Pedro, ao sentir a porta a lhe imprensar os dedos: “Ai, Miguel, meus dedos!”

São Miguel afrouxou a pressão e tentou de novo, ao que Pedro, mais uma vez protestou: “Ai, Miguel, minha mão!”

Doravante cada vez que São Miguel afrouxava para Pedro tirar a parte pressionada, mais ele se ia enfiando até estar todo dentro do Céu.

Resignado com a situação, porém ciente dos deveres, inclusive o de receber o ilustre recém chegado com tudo o que tinha direito, São Miguel desculpou-se por deixar-lhe momentaneamente sozinho e foi lá dentro, à presença do Pai e dAquele à sua direita, avisar-lhe da chegada.

Pela primeira vez Jesus desceu do trono. Para ir recepcionar Pedro. Escudado por São Miguel encaminhou-se à portaria, saudando Pedro que, sentado estava; sentado permaneceu.

Conversa vai, conversa vem, e São Miguel impacientou-se: “Pedro, meu lugar, por favor”. São Pedro com a cadeira grudada na bunda mudou de lugar. Mais uma, e outra, e outra vez e São Pedro sempre repetindo a operação. Aí, Jesus lembrou-se da promessa.

E São Miguel foi pesar alma, para quantificar-lhe os pecados; e São Pedro virou o porteiro do Céu em seu lugar. Isso foi pelos anos 70 da nossa era.

A segunda perda de São Miguel foi aqui em Itabaiana, em 1675, hum mil e seiscentos anos depois. Porém, essa história, real, fica para a próxima.

Até lá.

domingo, 16 de junho de 2024

16 DE JUNHO: UM DIA HISTÓRICO PARA SERGIPE.


 O primeiro prefeito de Itabaiana, na época denominado alcaide, foi nomeado há precisamente 324 anos, no dia de hoje. Mas não só ele. Com ele, e para Itabaiana foram nomeados os primeiros tabeliães dos 1º e 2º ofícios; e escrivão da Câmara Municipal de Vereadores; e o também escrivão do alcaide.

Porém a mudança na administração, até então concentrada na cidade de São Cristóvão, desde então passou a ser dividida com os recém criados municípios de Itabaiana, Lagarto, Santo Amaro das Brotas e Santa Luzia, hoje do Itanhy.

A priori, Itabaiana e Lagarto foram uma consequência da imposição real de Lisboa, posto a executar em fins de outubro de 1697, pelo governador-geral, D. João de Lencastro, com os municípios sendo instalados pelo ouvidor Diogo Pacheco. Mas o ouvidor, entendedor com maior profundidade da realidade sergipana, tratou de fazer um puxadinho; e, de imediato, instalou o terceiro município em Santo Amaro das Brotas, E meses depois concluiu um possivelmente desejo do Capitão Belchior da Fonseca Saraiva Dias Moreia, instalando a vila de Santa Luzia do Rio Real. 

Santa Luzia foi um claro contraponto à povoação, de origem popular, que lhe passou a pertencer, a da Estância de Henrique Dias no Rio Real, evolução da cidadela, militar, montada à época da reação à invasão holandesa. Estância passou mais de um século querendo ter sua importância reconhecida, fato que só em 1831 conseguiu. Já Santa Luzia, infelizmente não evoluiu, chegando mesmo a ser povoado de Estância.

Santo Amaro, o ponto mais estratégico no litoral sergipano, onde se construir um forte, uma cidade, também não evoluiu o suficiente durante o primeiro século, chegando a ser momentaneamente substituído pelo povoado de Maruim em 1835. Em nosso grosso modo de ver, a sede municipal – vila até o Decreto-Lei 311/38 – foi extremamente prejudicada por uma ocorrência estranha à governança: sua própria paróquia, item fundamental de governança das sociedades de até pouco tempo atrás - só veio existir ao fim do século XVIII. Enquanto Itabaiana e Lagarto só sobreviveram onde foram fundadas, graças aos efeitos, catalisador e amalgamador, das respectivas paróquias, Santo Amaro teve a primeira paróquia fundada na passagem de São Gonçalo, de frente para a atual Riachuelo, obviamente na margem esquerda do Rio Sergipe. Pior: dado à exiguidade da mesma, migrou, sucessivamente, primeiro para onde hoje está Divina Pastora; e a seguir, mais ao norte, parando na aldeia do Pé do Banco, onde tomou a denominação de São Gonçalo do Pé do Banco: Siriri, atualmente.

O fato é que, das primeiras unidades administrativas interioranas, a que menos demorou a se desenvolver foi Lagarto; e quase meio século depois Itabaiana. Já Santo Amaro das Brotas e Santa Luzia do Itanhy permanecem como aprazíveis, mas pequeninas cidades, depois de mais de três séculos de existência.

De qualquer modo hoje é um dia especial para os quatro municípios interioranos, em particular; e para o estado, como um todo, pela nomeação da sua inicial burocracia administrativa.

Registrar também que, apesar das travas características da época, porém Lagarto teve a primeira mulher da História de Sergipe investida num cargo público: o da tabeliã do 1º Ofício, Izabel Borges de Abreu.