quarta-feira, 17 de dezembro de 2014

CDL, 25 anos

Recebi agora pela tarde, das mãos do dublê de melhor office boy/gerente da cidade e melhor treinador de Futsal de Sergipe, quiçá do Nordeste, moirão da CDL Itabaiana, glória do Futsal brasileiro, Wilson Mendonça, ou simplesmente Galego da CDL, um convite proveniente da diretoria da instituição para a Festa de Confraternização que ocorre neste próximo sábado, 20, na sede da entidade, à Avenida Dr. Luiz Magalhães, Bairro Marianga, aqui em Itabaiana. Pra mim, não é somente a alegria de me fazer presente a um tipo de festa cada vez mais rara na comunidade itabaianense, onde pela natureza da mesma é reunida a sua elite, mas por ter o prazer de comungar dos 25 anos desta jovem senhora que ajudei a nascer, e dela só me distanciei quando a mesma festejou seu debut, há dez anos atrás. Um sonho que deu certo! Uma instituição que é a cara da moderna ex-seiscentista vila de Santo Antônio e Almas da Itabayana. É gostoso saber-se que nossos esforços, somados aos de tantos outros, não foram em vão. De uma ideia de cooperativa de compras a uma instituição sólida, altaneira. Parabéns, senhora, pelos seus 25 anos.
Na montagem fotográfica, o símbolo original do então Clube de Diretores Lojistas com o inevitável barco fenício; o selo desenvolvido para comemoração desta magna data e a pracinha com a torre de iluminação sobre a qual, em novembro de 1989, o próprio presidente e fundador, sob permissão da Prefeitura, Josenildo Pereira de Souza nela subiu pessoalmente lá em cima colocando a dita bandeira que tremulou por meses, fazendo a dita praça relembrar seu nome original de Praça da Bandeira. Agora da bandeira do comércio. Em tempo: na fotografia, que é de 1972, nota-se a presença do antigo Hospital Regional Dr. Rodrigues Dórea que, na época do alegado hasteamento já não mais existia.
(O selo comemorativo e de autoria de Eldon Santana)

sábado, 13 de dezembro de 2014

Dia de Santa Luzia

Duas imagens me vieram à cabeça hoje pelas cinco da manhã, quando fui acordado, involuntariamente, pela vizinhança próxima, ou nem tanto, e seus foguetórios de uma dúzia ou meia de foguetes. Logo me lembrei: dia de Santa Luzia. Dia de aniversário de Luiz Gonzaga, o eterno "Rei do Baião". 
Sobre Santa Luzia, sua lembrança me leva diretamente às novenas rezadas por meu saudoso pai, com jaculatória em latim (também ladainha e às vezes até a Salve-Rainha ou “Ave Regina”); à imagem de minha prima em terceiro grau, Conceição, e as balas de hortelã que me deu, quando eu tinha cinco anos e pouco de idade. De fato, até então, mesmo estando sempre na capelinha da Mangabeira com meus pais, quase todas as semanas, não lembro de lembrar da santa. Mas, a primeira viagem que me ficou na memória à Padaria, ou O Ponto, nomes com os quais se denominava o ponto de espera de condução na BR-235, e que hoje é o populosíssimo povoado Rio das Pedras, disso eu não esqueço. E não esqueço porque, além de ver a bonita prima, mocinha de seus 15 ou 16 anos, filha do primo Zé de Didi, filho da tia-avô Didi, claro, e de quem tanto minha mãe falava de boca cheia... além disso, a Ceição me deu cinco balas de hortelã, as quais me eram desconhecidas. Eu sempre ganhava balas e bombons; especialmente de Seu Martim de Cuta, bodegueiro e na Mangabeira; mas aquelas cinco balas me marcaram porque, além de diferentes, foram dadas por minha bonita prima... e que por conta da menta, arderam na boca que só o diabo! E aí, passei a observar que os quadros com figuras de Santa Luzia, misteriosamente com seus olhos no lugar, mas ao mesmo tempo portando um prato com fiéis cópias dos mesmos olhos dentro... eram a cara da minha prima Ceição. Adotei-a, pois; não mais apenas como mais uma santa católica; mas como uma espécie de membro da família. E não um membro qualquer porque... a minha bonita prima Ceição de Zé de tia Didi.
Sobre a devoção à Santa, isso nos leva diretamente à psicologia de Moisés, preso no deserto com uma multidão de miseráveis e esfomeados, perigosamente no limite entre a razão e a insanidade, e ainda tendo que lidar com importunantes cobras, e valendo-se da sugestão como antídoto eficaz (Então disse o Senhor a Moisés: Faze uma serpente de bronze, e põe-na sobre uma haste; e será que todo mordido que olhar para ela viverá. Num. 21, 8). Num tempo onde ter cegos perambulando pelas feiras livres, a cantar seus lamentos em troca de esmolas; e onde até os relativamente ricos como Cazuza Queiroz, e Otoniel Dórea, ex-intendentes de Itabaiana, ou poderosos bandidos como Lampião, eram cegos, em geral pelo acometimento do sarampo durante a infância, não era de se estranhar que tanta gente tivesse tal devoção à Santa. Pelo visto, a devoção continua forte, mesmo nestes tempos de sarampo praticamente erradicado e outros achaques visuais mitigados pela fantástica tecnologia de cura, hoje existente.

sexta-feira, 21 de novembro de 2014

Do financiamento de campanha e lendas de boto.

A explosão de mais um mega escândalo, desta vez o da Operação Lava Jato, apesar de fato corriqueiro, mais uma vez deixa o país boquiaberto. Petistas veem golpismo da oposição, que não faz o menor esforço pra que seja diferente; a oposição, por seus extremados, cunham, mais uma vez, a pecha de ladrões em petistas; e no fim, todo mundo treme, porque sabe muito bem que o monstro é uma hidra de milhares de cabeças, entranhado na sociedade brasileira desde os tempos de Mem de Sá quando foi proclamada a Lei dos Conluios por D. Sebastião, em Portugal. Todo brasileiro minimamente informado sabe que no Governo, ninguém faz nada sem levar vantagens extras. Do fiscal municipal de rendas a impolutos senadores e ministros, poucos são os que, tendo poder de decisão, se salvam. Não é de hoje, não é de ontem; vem de muito tempo. Sou funcionário público há 36 anos e estou cansado de ver colegas gabando-se de vantagens auferidas, quais seja a de poder chegar mais tarde no trabalho “que o outro”, ou até de faltar dias seguidos, “que o outro” não pode. “Levar vantagem”, é a ideia fixa.
A formatação do Estado colonial português deu nisso. Um Estado formado a fórceps, recém-saído da Idade Média, e carregando todos os vícios daquela; que teve de administrar uma expansão absurda de seu reino num prazo de menos de meio século, onde, além dos citados vícios, contou com a quase inexistência de uma mínima máquina administrativa. Considerável parte dos documentos portugueses de até fins do século XVII tem sérios problemas na grafia do idioma, pressupondo pessoas que simplesmente não sabiam falar bem o português, ou, se o faziam, eram pessimamente alfabetizadas. Em 1610, o viajante francês, Pyrard de Laval, conforme o Visconde de Taunay, horrorizava-se com a intensidade da corrupção existente no Brasil que burocraticamente mais importava naquele momento: a Cidade da Bahia ou Salvador, então capital da colônia. E não era pra menos, uma multidão de expatriados cristãos-novos, todos roubados, deserdados e ameaçados, tornados bichos encurralados pelas inúmeras e constantes extorsões e medo da maldita Inquisição espanhola (Portugal estava sob domínio espanhol), e certamente o assédio virulento, até mesmo por parte dos “da nação”, já incrustrados na máquina governamental. A coisa era tão brava que em carta à rainha D. Catarina, viúva de D. João III, de 06 de março de 1570, Mem de Sá justificava certas permissividades dizendo que as leis do Reino não podiam aqui serem aplicadas, por simplesmente não caber, correndo a colônia sérios riscos se o fosse. De medo, cinismo e hipocrisia formou-se o Brasil.

A tolerância e sua origem.
Em 1759 os jesuítas foram expulsos do Brasil e de todas as colônias portuguesas; e, obviamente de Sergipe. Durante mais de dois séculos a Companhia de Jesus tinha feito fortunas no Brasil, capitalizando-se para suas querelas paroquias na Europa. Nenhum interesse em ensinar curumin a ler, nem mesmo à maioria dos filhos de senhores de currais e engenhos. Foram os maiores senhores de escravos indígenas; assumiram o filão da agiotagem, herdando o mesmo gosto pela avareza condenada aos calvinistas e judeus holandeses, quando em Pernambuco. Enfim, fizeram fortunas. Em meados do século XVIII, pouco antes de serem expulsos de Sergipe chegaram a possuir 500 escravos indígenas somente na fazenda, hoje povoado Tijupeba, município de Itaporanga d’Ajuda. Além das outras “missões”. Mas em 1759 foram presos e deportados para fora do império colonial português. Claro, seus bens foram a leilão, em benefício da Coroa. Quatro anos após o primeiro leilão em Sergipe, o capitão-mor Joaquim Antônio Pereira da Serra Monteiro Corréa foi preso e enviado a ferros para Lisboa; todavia, ficaram os indícios de que, de fato, o grande articulador dos prejuízos à Coroa não foi o capitão-mor, e sim o ouvidor-mor Miguel de Arez Lobo de Carvalho, nunca provado.
O brasileiro, via de regra sempre foi assim: o Estado é o rei; e é pra ser roubado, extorquido. Absolutamente ninguém põe na mesma balança o assalto a uma empresa e a sonegação desta mesma empresa, ao Estado, obviamente. Em contrário: sonegar constitui um ato de bravura; de defesa contra o “rei mau”. Culturalmente é isso que pensam quase todas as pessoas. De forma que os crimes de apropriação indébita são muito relativizados, dependendo de quem o praticou e contra quem praticou. Logo, desvios de dinheiro público para fins eleitorais passa a ser devidamente perdoados; desde, claro, que o chefe da quadrilha divida parte deste dinheiro com os eleitores, que aqui e agora se constituirão em bando. Isso passa sob nossos narizes o tempo inteiro. Desde as eleições municipais, às de nível estadual e federal todo mundo rouba o erário, supostamente pra comprar votos e é devidamente perdoado porque roubou, mas dividiu com os componentes menores do bando.

A justificativa.
Existe na Amazônia a lenda do boto encantado, que aqui acolá deflora uma virgem engravidando-a. Ao aparecer grávida, a comunidade inteira – e não somente a família, especialmente o pai ultrajado, e às vezes o namorado, idem - jura matá-la, esfolá-la viva até que tomada de pavor a devassa torna-se uma pobrezinha revelando: “foi o boto”! Foi o boto! Ora, se foi o boto, fazer o quê? Cuidar do bebê, arranjar um pai adotivo, enfim. Todos os ânimos serenados e retornados à sua vidinha regular.
Causa-me tristeza – antes causava-me furor, que tive de administrá-lo – quando vejo certas obras nas cercanias, visivelmente superfaturadas, armengadas, e, salvo a oposição, sempre venal, ninguém diz nada! Nem mesmo pessoas que sabidamente não estão “comendo”. Nos idos de 2000 passei a navegar na internet e logo dei de cara com os portais do Governo Federal onde já dava pra se ter ideias razoáveis sobre os encaminhamentos de verbas federais. Logo estava arranjando confusões com gestores locais, empenhados em fazer politicagens ou sei lá por quais motivos mentindo sobre prazos e valores. Fixei na primeira página do meu portal os endereços dos ditos portais, e, depois que retirei o portal do ar, mantive tais endereços no blog que até hoje mantenho. Mas logo estava me impacientando com pessoas razoáveis, colegas da comunicação, inclusive, a replicarem notícias falsas, ao invés de irem na fonte. Pior: o maior portal do país laçou um sub-site denominado Contas Abertas, mas só o fez quando o grupo entrou pra valer no oposicionismo total ao partido então no Governo Federal, e, claro, todas as informações passaram a serem usadas, não pra esclarecer; mas, pra confundir, usando números verdadeiros, porém escondendo todos que não interessavam partidariamente, o que, de certa forma, acaba por desmerecer a informação verdadeira, tornando-a falsa. Em resumo, quase ninguém está nem aí para a sonegação contra o Governo e para a roubalheira no mesmo. Exceto a oposição, como sempre; até mesmo por falta de propostas mais claras e atraentes.
Muita gente saudando a apuração de mais essa roubalheira; que agora vai, que isso, que aquilo... “já combinaram com os russos”? Ou, como estão se comportando... qual o real interesse dos donos do dinheiro – o povo – em limpar a corrupção no Governo? Ele, o povo, se acha dono daquele dinheiro? 
Implicitamente, se o dinheiro roubado foi para a campanha política, então tá perdoado. Obviamente que mais da metade do apurado vira "sobra de campanha". Mas aí, "já que foi o boto...!"

terça-feira, 12 de agosto de 2014

O diabo é Chico!

Conta o anedotário político itabaianense que, o advento do acordão em 1990 pegou todo mundo de saia justa. Estava tudo certinho! Chiquistas votariam com Albano e com Collor; anti-chiquistas (ainda não havia propriamente o lucianismo) votariam com João Alves Filho, e aí, as opções para presidente se dividiam entre Ulisses Guimarães, Brizola e até Lula. José Queiroz da Costa, deputado federal, desportista, empresário, quase dono da Associação Olímpica de Itabaiana e da Rádio Princesa da Serra, osso duro de roer, estava mais que decidido: João Alves em Sergipe, e Brizola, em nível nacional. Prazos se aproximando - eleições, acima de tudo, são prazos - e o nervosismo cada vez maior. No plano municipal, Queiroz e o deputado estadual Djalma Lobo haviam rompido com o prefeito Luciano Bispo; e Chico de Miguel (Francisco Teles de Mendonça) estava completamente na oposição. Mas aí entra em cena o presidente da República, Fernando Collor de Melo, instando junto ao então governador Antônio Carlos Valadares, para que esse ajeitasse as coisas por aqui, onde coubesse eleições tranquilas, tanto pra Albano, quanto para João. Zoou um boato que Albano, antes do congelamento dos saldos bancários imposto por Collor em 15 de março do ano anterior, ao assumir, havia retirado enorme soma de dinheiro dos bancos. E que por isso, os demais teriam aceitado o "acordão" de forma mais fácil. O fato é que todo mundo aceitou entrar no mesmo. Quase todo mundo; Queiroz... não!
O médico Luiz Carlos Andrade, hoje imortal na Academia Itabaianense de Letras, logo, meu confrade, é de uma inteligência e um nível de humor e ironia imensos, além do sarcasmo lancinante, era presidente do partido de Queiroz, que, óbvio, demonstrou-se incomodado em entrar no acordão, e preferiu correr por fora, juntamente com seu parceiro Djalma Lobo. Mas Queiroz era Queiroz e possuía um canhão nas mãos chamado Rádio Princesa da Serra que, mesmo depois de 27 anos de existência de outras emissoras na cidade, ainda é olhada com respeito por quem entende disso, e por temor, pelo baixo clero da moralidade, em toda a região. Logo, Queiroz não era desprezível; descartável. Antônio Carlos Valadares tinha rusgas com o velho turrão, de muito tempo; João Alves Filho, em questões de Itabaiana, sempre seguiu seu braço direito, o itabaianense José Carlos Machado. Que nunca se afinou com Zé Queiroz. Coube, portanto, a Albano Franco, pré-candidato à reeleição ao Senado, a inglória tarefa de convencer Zé Queiroz a entrar pro acordão, e assim fechar a cancela. E lá se bota Albano a conversar com Zé Queiroz, que disse a ele, ser Luiz Carlos Andrade, ou, Luiz de Iracema, como ainda é conhecido em Itabaiana, quatro décadas depois de ter-se mudado para a capital, seu guru para tomada de decisões. E lá vai Albano conversar com Luiz Carlos. Promessas vão; promessas vem... quando Luiz Carlos assentia, Albano avivava os olhos e então fazia a pergunta cabal: “Estamos certos, então?” Luiz Carlos, então, saía com essa: “Tudo bem, Dr. Albano; mas, o problema é dividir o mesmo palanque com Chico de Miguel!” Aí, Albano rasgava mais outra ladainha, e isso, e aquilo e por fim, a pergunta: “Estamos certos?” E Luiz Carlos: “Tá tudo uma maravilha! Uma beleza. Mas... o problema é Chico!” Albano avermelhou as orelhas, depois o rosto, coçou a cabeça inúmeras vezes, e à quinta ou décima resposta de Luiz Carlos resolveu fazer a retirada estratégica. Óbvio, buscou aparentar deixar a porta aberta; mas nunca mais a ela retornou. O acordão deu certo pros seus protagonistas; Itabaiana ganhou várias obras do Governo do Estado, inclusive seu mercadão de hortifrutigranjeiros, e Queiroz e Djalma perderam suas respectivas eleições.
Esta história veio-me à mente há pouco, justamente ao ver a advertência de alguém de que uma terceira pessoa, junto a um determinado candidato, é-lhe perda de voto na certa. Ou seja, o eleitor até pode estar pensando em reconsiderar posições tomadas anteriormente, contra o dito candidato; mas, ao ver a criatura, estabanadamente com todo o seu poderio junto ao mesmo, vai recitar o Luiz Carlos: “Tudo bem! Mas, o diabo é estar junto com Chico!”

sábado, 21 de junho de 2014

O espírito do caudilho.

Tá faltando grama, neste jardim;
Tá faltando árvore, nessa cidade;
Tá faltando oxigênio, nessa atmosfera;
O que será, o que será, o que será, 
o que será da biosfera?
(BENJOR, Jorge. Salve o verde)
O estado de São Paulo entregue, à talvez maior adinamia administrativa de sua história, com sérios riscos até de não ter água pra tomar banho na região metropolitana da capital. Mas, segundo pesquisas de opinião, o candidato disparado pra ganhar as eleições pro Governo daquele estado é justo o que está no cargo, e que nele, via seus partidários, tem estado nos últimos vinte anos. Por outro lado, o país quase chega ao nível do chamado "Primeiro Mundo", com economia sólida, conseguindo se segurar diante de todas as campanhas especulativas dos abutres mundiais, nesta crise mundial interminável, além de enfrentar a politicagem local, e, a candidata à reeleição e atual dirigente máxima está na frente; mas não com a folga que teoricamente deveria estar.
Faz justo um ano que a mídia turbinou uma manifestação amorfa, sem pé nem cabeça, nem mesmo sob a coordenação do Instituto Millenium – versão atual do golpista IPES de 1964 – a coisa fechou num rumo coerente. Mas houve! E não adiante tentar minimizá-la. Foi um quinto do que faz supor a mídia, toda ela politicamente contra o Governo Federal; mas houve, e não foi pequena.
Leio hoje, especial intitulado “Des anos sem o caudilho”, no Notícias Terra, que, óbvio, fazem justos dez anos que Leonel de Moura Brizola nos surpreendeu, negativamente, ao nos deixar de uma hora pra outra, sem sequer um anúncio prévio. Voluntarioso, dono de si, surpreendente, como sempre, até ao morrer. Um típico produto dos pampas gaúchos e seus campos intermináveis, com seu absoluto instigar à liberdade plena. Foi-se ali, a última grande referência da paixão como forma de exercício político. O fogo! O arder! A palavra dita com maestria, arte, e tal vitalidade, que incendiava corações. O linguarudo. O político em essência. Aquele que não levava desaforos pra casa. Que nem estava aí de peitar o sistema; pouco importando, nem mesmo se o dito sistema era o de dominação americana, calcada num império de comunicações muito bem plantado no país, tal qual a denominação hispânica dos primeiros séculos de Brasil, calcada no trabalho de suas ordens religiosas, todas católicas, obviamente.
Em 1980 o país acordou para uma nova realidade: o primeiro partido realmente operário do país, formado a partir de um símbolo, seu operário-mor, que conseguiu chegar à Presidência da República e viabilizar este mesmo partido como o partido modernamente mais bem organizado e poderoso do país. Tudo isso teve custas. E seu operário-mor, que sempre disse o mesmo que diz hoje, teve que vestir o figurino do rude torneiro mecânico de sua origem, na sua origem; mas volver-se para uma versão amena que o tornou o maior líder atual do país, um dos maiores de sua História, e referência na própria História mundial, da atualidade. Sua figura, transformada no grande estadista que se revelou, contudo, tem um preço, preocupante: no seu próprio partido, todos passaram a serem "Lulas paz e amor"; bombeiros de incêndios inexistentes, enquanto sem preparo algum pra dominar o fogo, pra que este arda, e somente onde deve arder. 
Estamos ficando fartos de politiquinhos bonzinhos, educadinhos, refinadinhos, mansinhos e de falas mansinhas. Na minha modesta opinião, parte do que se viu há um ano, foi este grito por socorro. 
Tá tudo enlatado, certinho, previsível demais. Em São Paulo, entre o extranumerário do Opus Dei, Geraldo Alckmin e sua mansidão, e o manso Padilha... ora, porque mudar, se são a mesma coisa? E porque mudar da gerentona Dilma Roussef, pro candidato do Choque de Gestão, Aécio Neves, se, além de seu tal Choque não ter transformado Minas Gerais numa vitrine, vem acompanhado dos mesmos bonzinhos, educadinhos, refinadinhos e mansinhos de falas mansinhas, que foram tirados do poder em 2002?
Sergipe... meu Sergipe! Aqui a coisa é um pouquinho pior. Pra variar, a última grande novidade na política sergipana, Marcelo Deda Chagas, é falecido. A segunda mais nova, João Alves Filho, hoje prefeito de Aracaju, tem 40 anos de ingresso nela. Quatro a menos que o atual governador, Jackson Barreto de Lima. Como viabilidade ainda temos Antônio Carlos Valadares, com 48, Albano do Prado Pimentel Franco, idem. E aí vem a novidade: Eduardo Amorim. Bonzinho, educadinho, mansinho, de fala mansinha... e pior: sem comando político, porque o comando político é do seu irmão, Edvan Amorim. Será a eleição “compre um, e leve dois”. Particularmente, acho pouco provável o atual governador, Jackson Barreto de Lima, se reeleger; mas quem será o governador, não será Eduardo, todos sabem; será Edvan, que de fato, já tem o real controle, o comando, de muita coisa dentro da máquina do Estado. Uma máquina formidável de comando e estratégia tal, que começo a vê-lo semelhante a José Matheus da Graça Leite Sampaio, o construtor – esquecido – da Independência de Sergipe; do Barão de Maruim, o agiota que consolidou a mesma Independência (além de mudar a capital para Aracaju); ou o grande coroné sergipano da República Velha por estas plagas, Manuel Presciliano de Oliveira Valadão. De fato, até o momento, mais está a parecer com este: o domínio da política como fator de sucesso meramente pessoal. E porque acho que Jackson Barreto não ganha? Ora, bonzinho, educadinho, mansinho, de fala mansinha... um pelo outro, é muito mais provável o Eduardo Amorim, porque, além de ter apenas 12 anos na política, há a vantagem, sobredita do “compre um, leve dois”. A mídia sergipana, praticamente toda ela, está cercada com os tentáculos de Edvan; há indícios de sua influência direta em pelo menos metade dos 75 municípios de Sergipe, através de suas prefeituras. O Governo de Sergipe se encontra numa situação análoga à do Governo Federal: tem a caneta, mas depende de acordos. Acordos com os comandados de Edvan. Tem o poder, mas não parece exercê-lo com presteza, nem mesmo nos atos administrativos simples; já que todas as secretarias estão contaminadas com agentes de Edvan. No Judiciário, é um Deus nos acuda. Bonzinho, educadinho, mansinho, de fala mansinha... isso não era Jackson Barreto a peitar a família Franco da década de 70, o que o tornou grande liderança e grande aliado de João Alves Filho, este já sob o mesmo fogo “amigo”, assim que cravou 79 por cento dos votos pra governador do Estado na primeira eleição direta do fim da Ditadura, em Sergipe. Aquele Jackson Barreto, hoje, além de ser governador, o que exige outra postura, praticamente acabou em 1998. Sergipe perdeu ali seu último caudilho, ganhando em contrapartida um político “técnico”. E, técnico por técnico, a estratégia de Edvan Amorim para assumir de fato o comando do Estado e do estado, está me parecendo infalível.
Até que o espírito do incendiário, passional, torrencial, Leonel de Moura Brizola, baixe em alguém, que dê uma firme sacudidela em “tudo isso que está aí”, vamos continuar no campeonato entre os bonzinhos, educadinhos, mansinhos e de fala mansa.
Ah se pelo menos os cinemas ainda existissem, e José Queiroz da Costa fosse vinte anos mais moço... 
Tá faltando oxigênio nessa atmosfera!

segunda-feira, 9 de junho de 2014

A única saída.

Desde sua Independência, em 08 de julho de 1820, que Sergipe vive a saga da democracia sem democratas. Vieram os partidos dos camundongos e rapinas que se digladiaram até o fim do Império; e, em seguida, pebas e cabaús mantiveram a mesma rota. Depois udenistas e pessedistas e seus atuais sucedâneos. A existência da polaridade, coisa normalíssima e salutar em qualquer estado, em Sergipe, reveste-se de uma peculiaridade ridícula, que é o coronelismo. Os grupos tem se mantido com razoável união, graças ao instituto do coronelismo. A política estadual nasceu assim, com José Matheus da Graça Leite Sampaio de um lado e José Acioly de Barros Pimentel do outro. O desaparecimento de ambos deu na substituição por outros, sempre. Manteve o status quo. 
Nunca na história de Sergipe houve a formação de um grupo, coeso, democrático internamente e de propostas desenvolvimentistas. A História de Sergipe está repleta de individualismos e brigas encarniçadas pelo poder pelo poder. Todos os momentos de progresso do estado deveram-se a intervenções externas. Todos. Inclusive na administração do Estado. A fórmula criada no Império mostrou-se quase eficaz: um presidente – e às vezes outros agentes administrativos – nomeado diretamente pelo Imperador, em pessoa de sua inteira confiança, preparado tecnicamente, razoavelmente isento das querelas e mesquinharias paroquiais; para dar um viés democrático, até seis vice-presidentes – às vezes até o terceiro assumiu, temporariamente - porém, sem força política acima das diretrizes imperiais. A segunda grande intervenção veio com o estabelecimento da cultura do algodão que livrou o estado da monocultura açucareira, criando, assim, um mínimo de diversidade. Desde então, às crises internacionais do açúcar, houve a resposta do setor cotonicultor, constituindo estes dois setores, nas duas alavancas ao desenvolvimento que levou Sergipe a ser o segundo estado mais industrializado do Nordeste em 1910, e o oitavo no país. Tão logo o Estado de Sergipe se consolidou, saindo de debaixo do Governo da Bahia a quem pertencera completamente de 1759 a 1820, e na prática e parcialmente, desde 1590 a 1757, houve sensível progresso na então província. Isso em nada teve com a possível ideia progressista de suas elites, enfronhadas, unicamente, na ideia de manterem seus privilégios na máquina pública, e os contratos de entrega de açúcar, que os deixavam em dia com banqueiros, que, de fato, foram os grandes beneficiários dos lucros fáceis da escravidão. Observa, com propriedade, a historiadora Maria Thétis Nunes, que foram os pecuaristas, e não os senhores de engenho de Sergipe, os responsáveis por todas as grandes transformações que houve no estado; até mesmo a sua Independência. Sempre dependemos “do homem”. Aquele que, com seu sacrifício, sempre e inicialmente na vã ilusão de obter vantagens, bem ou mal, tem conduzido o estado. Até ser substituído.
A Revolução de 1930 modificou muita coisa no país. Em Sergipe, muito pouco. Os novos atores durante o período revolucionário, especialmente durante o Estado Novo, não passaram de coronéis, com nova roupagem, a tentar se imporem; sem muito sucesso, porque apolíticos. No ressurgimento da democracia, a partir de 1946, criou-se a figura de transição, do burocrata, desenvolvimentista, bem ao gosto do Nacional-Desenvolvimentismo, jovem, egresso da velha elite, na sua parte mais poderosa. Não demorou e a briga intestina do velho senhorio de engenho restabeleceu os tempos de chumbo de camundongos e rapinas, pebas e cabaús, até que o Golpe de 1964, apoiado por ambos, gerasse mais um hiato nas tensões. Estas, contudo, se mantiveram latentes, nem sempre preservando o armistício; apenas contidas pela intervenção do poder central do país. O retorno à democracia, iniciado antes mesmo do fim do regime de 1964, muito prometeu. Pela primeira vez, um homem totalmente do povo, ocuparia o poder central. Coincidentemente, tutelado pelo mesmo agente transformador da outra abertura política, 36 anos antes, o novo governante era a cara do povo; seria o fim de um sistema que transformou um estado pequenino, facílimo de administrar, numa das mais intricadas porções de terra deste país, tais os interesses espúrios arraigados, de gerações secularmente nutridas pela máquina pública. Não deu! No segundo ano, depois de dois de intensos tiroteios, traições dentro da máquina, reformulação das panelinhas ou fortalecimentos delas, na mesma; negociatas impostas pelo Legislativo no melhor estilo rapina e camundongo, o Governo foi às cordas, num escândalo armado com a imprensa nacional. E desde então, foi um correr atrás de prejuízos sem fim. Em 1986, correu-se o risco, inclusive, de aborto na retomada dos investimentos, de fato iniciados em 1977. Num momento delicado da política nacional, com a República acéfala, já que havia apostado todas as suas fichas “no homem” Tancredo Neves, falecido antes da posse; com a volta da política em toda a sua dimensão, inclusive na corrupção, de que de fato nunca se afastara, mesmo nos anos de suposta administração “técnica”, dos militares, o quadro era preocupante. A solução não poderia ter sido melhor: um homem público para administrar o que viria a seguir. Nada de super-herói; do cara sabe tudo, resolvedor; mas, um político. Na mais fina acepção da palavra. Conduziu com maestria um estado e um Estado carcomido de vícios seculares e de tudo o que disso possa advir. Abriu mão de permanecer no primeiro time em nome de uma conciliação extremamente necessária naquele momento. Tranquilamente retornou ao centro quatro anos depois onde ainda hoje permanece. Participou de mais uma tentativa de mudança na política do estado, nunca titubeando na sua função, ora de bombeiro, ora de escora, até mesmo de oráculo. O que veio a seguir ao fim de seu governo, foi o acirramento das posições beligerantes entre os grupelhos em disputa pelos quinhões dentro da máquina pública; que não deu trégua, sequer ao homem mais poderoso do estado, porque o mais rico, quando no comando do Governo. O ápice desta guerra movida contra o Estado e seu homem de comando ocorreu com o trágico desaparecimento da última esperança, em termos de novidades, dos últimos 50 anos: Marcelo Déda Chagas, morto por um câncer; mas, antes, abatido, de joelhos diante de uma sociedade manipulada pelos que vivem com a cabeça em 1800.
A democracia é o pior dos regimes, exceto todos os outros. A afirmação de Winston Churchill é inquestionável. E a grande vantagem da democracia é a possibilidade que temos, de consertar tudo, a cada quatro anos. Nada se compara a isso. Homens aparecem e desaparecem. As sociedades, também;  em que pese viverem e permanecerem, de um modo ou de outro, por algum tempo mais. Dependem deles, pois, que, como ganho, a única vantagem de que dispõem é o reconhecimento pela História, contada e estudada pelas gerações futuras. Claro, seus descendentes próximos, no máximo até a quinta geração, também serão beneficiados; mas é a história que os perpetuarão. Sergipe tem, neste ano, mais uma chance. No plano estadual, o que se verifica é o preocupante avanço cada vez maior da agiotagem sobre o comando do poder; quer nas instâncias menores, os municípios; quer na instância maior, o Estado, e em todas as suas casas legislativas, com cada vez mais gente de condutas questionáveis ascendendo ao poder. Essa agiotagem é criminosa, não somente pelo ato em si, mas pelo que engendra em todo o seu conjunto; já que o crime nunca se compõe de apenas um ato criminoso. O escândalo envolvendo Floro Calheiros (assassinado), Joaldo Barbosa(Nego da Farmácia)(assassinado), e Antônio Francisco Sobral Garcez, não acabou este tipo de crime no estado; em contrário; mais se acentuou e se sofisticou, depois daquela tragédia. Diante da polaridade ora verificada, com nítidas chances de absurda piora no quadro geral do Estado e por tabela no estado, resta-nos a esperança de uma ponte. Alguém que consiga transitar por este mar de vícios, recuperando o máximo possível do que for recuperável; isolando o que não tem jeito, já que sua destruição nem sempre é salutar. E até queimando a erva daninha, irrecuperável.  Alguém que conduza. Ao menos que dê um refresco, por algum tempo. Um político. Só um político, salva Sergipe do desastre que se anuncia. Depois de 50 anos de vai-e-vem... restou Antônio Carlos Valadares; atual senador, PSB. Pessoalmente, ou voto nele, ou não voto em ninguém. O tempo dirá se teremos sorte; se eu estou certo. Mas não vejo outra saída.

sábado, 31 de maio de 2014

À garota folgazã Antônia Amorosa.

"Teco teco teco teco teco na bola de gude, era o meu viver, quando criança no meio da garotada, com a sacola de lado, só jogava pra valer." 
Esta música tão bem cantada pela Gal Costa, pra mim, simboliza a garota e adolescente Amorosa. E por esta imagem de liberdade, de aparente não seriedade com as pesadas coisas da vida, é que quase cometi uma injustiça, de cujo ato, ainda hoje me penitencio, porque me serviu de enorme lição de vida.
Em 1981, o radialista e hoje deputado estadual Gilmar Carvalho tinha um "programa romântico", aos domingos, à noite, na então novidade na radiofonia sergipana, a Rádio Princesa da Serra; escola de tantos, inclusive deste reles escriba, aqui. Eis que Gilmar é contratado pela então Rádio Difusora de Sergipe, hoje Aperipê, e o horário ficou vago. O programa, conduzido por um cara que nunca sequer tinha namorado na vida até então (uns 18 anos de idade, tinha o Gilmar) era um sucesso absoluto. Crônicas, cartas de ouvintes, nenhuma interação direta, mas sempre abrindo canais para o externar dos sentimentos da garotada, naturalmente toda feminina. Seria de grande perda para a emissora a sua não continuidade.
Começado no rádio com um programa meio atípico para a região, inspirado no famoso Cavern Club, de Big Boy, da ex Rádio Mundial do Rio de Janeiro, eu havia evoluído pra discotecário e uma espécie de faz tudo dentro da emissora, no que o tempo me permitia. Aí, Juarez Ferreira de Gois, meu então chefe, no meu então emprego de carteiro dos Correis e Telégrafos, e superintendente da emissora, fez-me a proposta: manter o programa criado por Gilmar, porém com outra denominação, apesar de manutenção do gênero. Topei! Cheio de ideias na cabeça, e sabedor das limitações de Juarez como locutor, justo pra fazer frente ao então jovem e inexperiente, mas já então excelente comunicador, Gilmar Carvalho, resolvi criar uma série de atalhos que reduzisse a distância, e mantivesse a qualidade do programa, com ganhos, até, se possível. Um dos quadros criados foi uma mini novela, cujo tema, claro, folhetinescos casos de amor com tudo que tem direito: ciúmes, traições e tragédias, etc.. Bem a ideia, eu tive. A história e demais que vieram a seguir, eu as fiz; mas, e o principal? O material humano para dar forma a essas ideias? A sonoplastia eu havia preparado, e contava com excelentes técnicos de mesa de som para por em andamento, inclusive o jovem impetuoso e mui talentoso, Osvaldo Santos. Pros atores masculinos, tinha material. Não era dos melhores, mas quebravam muito bem o galho; mas faltava-me o principal: a voz feminina. Ardemos a cabeça, eu e Juarez, em busca da voluntária (não vencia soldo, claro), entre as meninas que costumavam frequentar a emissora. Nada. Ou não se ajeitavam com o texto, ou simplesmente morriam de vergonha em pelo menos tentar.
Domingo da estreia do programa em nova roupagem. A emissora não tinha estúdio de gravações; por isso, estas eram feitas nos espaços de tempo em que o sinal era passado direto para o transmissor, nos horários reservados à Agencia Nacional, seja da Voz do Brasil e sequente Projeto Minerva, durante a semana, de segunda a sexta; seja durante o Projeto Minerva do Domingo, e o sequente Nosso Domingo Musical, tudo programas do MEC, com a finalidade de difundir a cultura. Hora do vamos ver, e nada da ansiada voz feminina que faria a interpretação da única mulher envolvida no drama para aquele dia, que não era qualquer um: era o dia da estreia! Decidimos desistir do projeto, mas, enquanto tomávamos a decisão, entra Osvaldo Santos com uma última ideia: “E se chamarmos Amorosa? Amorosa é “boca quente”; ela sabe fazer!” Amorosa! Nome, no mínimo artístico; já que não conhecia e nem conheço até hoje, ninguém com este nome. Em não a conhecia, disse a Osvaldo que em vão tentou-me convencer de que a conhecia, sim, dando vários indicativos que me foram em vão. Nem também a conhecia Juarez Ferreira de Gois, nem João Batista Santana, jornalista e diretor artístico da emissora. Bem, mas, quando se está perdido, qualquer caminho nos leva pra casa, dizem. Liberamos o Osvaldo pra ir tentar ver se “a tal Amorosa” topava. Menos de dez minutos estava o Osvaldo de volta, trazendo Amorosa. A garota, eu conhecia sim; estava acostumado a vê-la próximo de sua residência, na Praça da Bandeira, já então rebatizada de Avenida Airton Teles, e em quase em frente ao antigo Hospital Regional Dr. Rodrigues Dória, hoje um terreno baldio onde funciona a Associação dos Estudantes Universitários de Itabaiana. O local, além de todos esses quesitos, nesta época ainda abrigava a única agência de ônibus da Cidade, já que não tínhamos Estação Rodoviária, e era uma espécie de canal de entrada, de afunilamento, para a numerosa estudantada do Colégio Estadual Murilo Braga. Mas, Amorosa não me causou lá grande impressão, confesso. A imagem que dela tinha, era justo a imagem de “garota folgazã, onde em toa parte que passava encontrava um fã”, que “quando havia festas no lugar era a primeira ser chamada para ir cantar” e fugia completamente ao modelito por mim acreditado, como certo para aquele papel. Mas sempre tive pavor de machucar alguém; e declinar naquele momento, não devia por dois motivos: era mais uma tentativa, talvez a última; e com certeza eu iria machucar profundamente aquela criatura que, apenas me parecia diferente do que eu precisa parra executar aquela tarefa; mas era uma pessoa humana! Logo, merecedora de todo o meu respeito. Meio sem graça, completamente incrédulo, passei-lhe as folhas datilografadas com o diálogo, observadas as suas possíveis participações e esperei. Menos de cinco minutos depois, e eis que chega Amorosa: “Vamos gravar?” Bem, o tempo urgia; só tínhamos no máximo mais meia hora... era pegar ou largar. E lá fomos pro estúdio. Ela e Juarez inicialmente, pro aquário; e eu e o Osvaldo na técnica. Osvaldo abre o microfone, Juarez começa bem a sua interpretação e... o que se seguiu, me fez cair o queixo. E me serviu e lição pro resto da vida. Sem errar uma letra; numa interpretação digna de grandes atores nacionais, ela desfiou sua interpretação num realismo que, na terceira semana, levou a polícia à porta da emissora a perguntar onde “havia sido o crime que a rádio estava falando”, tal o nível de realismo que conseguimos imprimir àquele pequeno pedaço de arte. E, óbvio, Amorosa foi o esteio, a estrela única daquele trabalho. 
Uns dois meses depois, a emissora recontratou Gilmar Carvalho, que não reeditou o programa que lhe foi deixado por Juarez. Quanto a Amorosa, logo a seguir, mais uma felicidade de um encontro. Desta vez, com o casal, o saudoso Uéliton Mendes e sua esposa e hoje viúva, Dirce Mendes, que então montavam o grupo musical Asa Branca, que projetou Amorosa pro estado e além-fronteiras. Ontem, na sua fala sobre o lutador e grande artista Zé Bezerra, patrono de sua cadeira, a de número 18, na Academia Itabaianense de Letras, tudo isso me passou como um filme na memória. E reafirmou-me as lições de vida recebidas.
Parabéns, minha amiga, por você ser o que e quem é.

sexta-feira, 25 de abril de 2014

Pequena lauda sobre Sebrão Sobrinho

A solenidade de recepção ao acadêmico Vladimir Souza Carvalho, em sessão solene da Academia Itabaianense de Letras, ocorrida no plenário da Câmara Municipal de Itabaiana, hoje à noite foi, pra muito não me alongar, excelente. O saudou o acadêmico Luiz Carlos Andrade, um contador de causos e criador ímpar de armações, tão bom quanto o exercitar de seu ofício de grande médico que é. Pelo próprio Luiz Carlos Andrade fiquei sabendo que um furdunço que percorreu a vida intelectual e informativa de Sergipe há duas semanas passadas, sobre ter o saudoso José Wilker residido em Itabaiana, foi armação de Luiz Carlos. Brincalhão por natureza, num determinado ponto da capital o Luiz resolveu, junto com o próprio Vladimir, fingirem-se de extremamente enlutados pela morte daquele que dia teria trabalhado no serviço de alto-falante de Zeca Mesquita, no início dos anos 60; estudado na famosa escola particular de Maria de Branquinha (que de fato só recebia crianças), e, claro, teriam ajudado o ilustre morador a carregar o caminhão de mudanças, quando este partiu de Itabaiana para a glória nos teatros e telões do país, e para a Rede Globo de Televisão. Tudo invenção; que alguém jogou para um jornalista da capital, que, sem conferir, criou a maior polêmica. É Luiz Carlos, o cara que resolveu desmoralizar a burocracia pesada e burra do INSS (então INPS) com um tal de laudo à perícia do instituto, que falava até numa tal de “caixa da parafuseta”. Foi a maior galhofa no estado, na época. Mais ou menos na linha da história do Julinho da Adelaide do também presepeiro Chico Buarque de Holanda. 
Bem, mas, voltando à sessão solene desta noite, me deliciei ouvindo Vladimir descrever-me ao falar sobre si próprio e sua busca frenética em cada frase ou texto de cada livro; mais ainda quando seu bairrismo transpareceu ao narrar a descoberta de um livro sobre Itabaiana, e escrito por um itabaianense, que em seguida acabou descobrindo que era seu tio, conhecido apenas pela alcunha de família. À medida que discorreu sobre a personalidade de José Sebrão de Carvalho, o Sebrão Sobrinho, aí, eu próprio fiz uma viagem interior sobre o passado recente. Fui acondicionado a ver em Sebrão um personagem folclórico, senão exagerado, e até supostamente fantasioso. Ocorre que na intensa e extensa pesquisa que fiz, de cujo produto já saíram quatro vídeos e estou em véspera do quinto e último da série, e o meu livro recentemente publicado, é impressionante o tirocínio do velho brigão; fantástica a coleção de dados históricos por ele elencada. Sebrão viveu longe e até em conflito permanente com a cátedra; mas seu trabalho de esgaravatador em tudo quanto foi bibocas em busca de papeis velhos lhe deu uma visão sobre a historiografia sergipana que ninguém teve até hoje. Comportamento que foi o estopim para a brigalhada que sustentou por décadas com os catedráticos, já que, além de dispor de material pra ligar todos os pontos, o encrenqueiro itabaianense, quase ranzinza, não media as palavras quando era pra defender seu ponto de vista. O mesmo deslumbre que Vladimir teve ao conhecer de perto a Sebrão Sobrinho, tive eu de confirmar ponto por ponto suas afirmativas, muitas delas até hoje tidas como estapafúrdias, pela intelectualidade sergipana. 
Eu gosto de quem faz. E Sebrão, fez. E fez bem feito. Só isso já o coloca no meu panteão particular de heróis locais.

terça-feira, 15 de abril de 2014

Agradecer: uma questão de justiça!

No último sábado, a Prefeitura Municipal de Itabaiana, por seu titular, Valmir dos Santos Costa e equipe inauguraram as obras de ruas adjacentes e da Praça da Mangabeira, povoado onde nasci, e cuja feição urbana foi criada pelo meu saudoso pai, Alexandre Frutuoso Bispo. As obras se arrastaram por quase cinco anos, já que iniciadas na gestão passada, a do ex-prefeito Luciano Bispo de Lima, mas foi nesta gestão atual que tomou impulso, chegando ao estado de realizada.
O povoado Mangabeira se estabeleceu em tempo idos do século XVII, como local de passagem da estrada real de Itabaiana para São Cristóvão, a primeira capital de Sergipe. Levantamentos do Professor Lima Jr., trazem que o local foi doado à capela do Sr Bom Jesus do Matosinhos em 1744, pelo alferes Antônio Machado de Mendonça e sua esposa D. Francisca Gomes de Oliveira. Todavia, nenhuma igreja foi construída no local, e nem ficaram registros da dita capela na Matriz de Santo Antônio e Almas da Itabaiana, a cuja freguesia, até pouco tempo atrás pertenceu. O incremento populacional na região, verificado no início do século XX, dotou-a de vários pequenos sítios, propriedades típicas do agreste itabaianense. O meu bisavô, sempre pela linhagem paterna, chegou à região ao fim do século XIX, possivelmente vindo do município de Lagarto, já aqui tendo nascido meu avô em 1884. Fincou raízes na parte norte do povoado, dividido ao meio pelo Riacho do Meio, na época conhecida como Mangabeira de Cima, e também atravessada pela velha estrada real. Foi neste local que lhe nasceram os onze filhos, dos quais se criaram nove, sendo meu pai o terceiro, antecedido pela minha tia Joana e pelo meu tio Vitorino, ou Vito.
Em 1945 havia uma magia no ar. O Nacional-Desenvolvimentismo dava seus primeiros passos mais visíveis na forma de estradas, poços artesianos, escolas, melhor estrutura de arrecadação e distribuição de recursos, progresso, enfim. O futebol se firmava como paixão nacional, e logo meu pai conseguiu criar um time de futebol, e aproveitou o descampado típico de cerrado, cheio de mangabeiras, ganhadores, cajueiros bravos e alecrins, conhecido como tabuleiro dos mosquitos, dentro do então imenso sítio de seu pai, e ali criou um campo de futebol. O meu pai, apenas alfabetizado, era um devoto fervoroso do progresso. Também católico fervoroso, logo, catequizado pela ideologia hiper conservadora da Igreja, não podia ouvir falar em Reforma Agrária e outras bandeiras socialistas que lá estava ele de ouvido colado no rádio ou na conversa afim, torcendo pelo bom sucesso da ideia. Mas, ninguém falasse na palavra "maldita" perto dele: comunismo. Lembro-me de uma reunião havida no povoado Lagoa do Forno, nos idos de 1966, onde eu, pequenino, fui com ele lá participar, mesmo que todo mundo ficasse apreensivo, pois se tratava de uma reunião que daria na fundação do atual sindicato dos Trabalhadores Rurais de Itabaiana, e, naquele momento, com o recém instalado regime golpista de 1964, todo mundo vivia amedrontado com qualquer coisa do gênero. De fato não havia perigo algum porque o sindicato nasceu pelego e nunca foi diferente disso – nem poderia, já que mais uma central assistencialista. Ainda sobre alfabetização, além de ter aprendido contra a vontade de meu avô, por interferências de terceiros passou a ensinar sob seu consentimento aos irmãos – as irmãs não podiam: “pra não aprenderem a mandar cartas pros namorados”; coisas dos tempos do carrancismo. A minha avó paterna era tão católica fervorosa quanto meu pai, e faleceu em 1946, deixando uma dívida pra ele: providenciar o pagamento de uma promessa feita a Nossa Senhora Santana, de uma noite de rezas, com fogos de artifícios, etc., e etc.. Muito querida na vizinhança, o anúncio de meu pai de que iria pagar a promessa feita pela minha avó, movimentou a comunidade e, dois vizinhos em especial, resolveram estimular o meu pai a construir uma capela para realizar tal ato, foram eles: Martim Pedro da Conceição (Martim do Forno) e José Martins dos Santos (Martim de Cuta). O primeiro entrou com recursos e propaganda; o segundo com a organização da arrecadação junto à comunidade, inclusive ele. Uma semana antes do novenário da santa, cuja dia de consagração é dia 26 de julho, e a cumeeira subiu, ficando pronta na véspera da primeira das noves noites de reza – e não apenas uma, devida pela promessa. Desde então, o lugar foi consagrado à santa como padroeira, e todos os anos é realizado o novenário. Ainda em 1947, meu pai pleiteou e conseguiu junto ao prefeito de Itabaiana, Manoel Francisco Teles, a construção da estrada de rodagem entre o povoado e a estrada estadual, entre Itabaiana e Laranjeiras, que, coincidiu ser o local de entroncamento também com a nova estrada, a federal BR-235, aberta em 1952, para dar apoio logístico à Hidrelétrica de Paulo Afonso na Bahia, e que inicialmente ligou Aracaju a Jeremoabo, passando por Itabaiana. Em 1949, travou uma batalha campal contra o prefeito Jason Correia que queria levar uma escola rural para outra localidade, então quase desabitada, onde residiam parentes seus. Foi de importância ímpar a participação firme do jovem ex-deputado Dr. Aírton Mendonça Teles, filho de Manoel Teles que interveio junto a seu pai para que fosse definida a Mangabeira como o local da escola, que ainda hoje ali está. Mesmo já residindo fora do povoado, mas recordo nos idos de 1967 ou 1968, sua dor de cotovelo por serem os povoados Ribeira e Cajaíba servidos por energia elétrica, e a Mangabeira, não. Dor de cotovelo que aumentou ainda mais, quando em 1971, a rede começou a ser colocada no povoado Serra. Quanto a este item, faleceu em 14 de junho de 1988 satisfeito: a energia elétrica havia chegado à Mangabeira dois anos antes.
A Mangabeira é um povoado existente na região sul do município de Itabaiana, Sergipe, tipicamente agrícola, servido pela irrigação do Projeto Ribeira, situado entre o Rio das Pedras, ao norte e oeste, e os riachos do Tronco e Francisco José, ao sul, sendo dividido do povoado Serra Comprida, este já no vizinho município de Areia Branca, pela linha traçada entre os pontos mais altos das serras de Cajaíba e de Itabaiana. Possui água encanada, energia, telefone, porém seu acesso ainda é por estrada de terra. População aproximada de 500 habitantes, servida por duas escolas de primeiro grau, não completo, sendo uma estadual, a Escola Rural da Mangabeira, fundada em 1949, e uma municipal bem mais recente. Tem associação de moradores, que são majoritariamente católicos, e já há mais de dez anos realizam uma muito bem planejada e executada peça teatral encenando a Paixão de Cristo, mesmo em se tratando de pessoas simples, sem ensinamentos sobre encenação, praticamente todas elas agricultores.
A inauguração realizada no último sábado, 12, deste corrente abril de 2014, além de corrigir um problema, o do desprezo a que esteve relegado o povoado durante anos, eleva a autoestima de todos que ali vivem ou que dali vieram, como eu, fazendo justiça àquela comunidade que tem no trabalho uma devoção; algo sagrado, como pregou Hesíodo.
Em nome de meu pai, que se vivo estivesse o faria, quero agradecer aos mangabeirenses que criaram o grupo teatral da Paixão de Cristo, vitrine primordial para que viesse o projeto e obras que agora se realizam; quero agradecer ao meu amigo, ex-vereador João Alves dos Santos, o querido João Patola, pela força que deu aquele grupo ao propagar-lhe o trabalho, há dez anos, quando ainda nascente, no seio da sociedade urbana de Itabaiana; quero agradecer a administração municipal anterior por ter desenvolvido este projeto, em que pese tê-lo congelado por mais de dois anos; quero agradecer ao prefeito Valmir dos Santos Costa por ter arregaçado as mangas e concluído o projeto, transformando a velha praça empoeirada num belo jardim e seus equipamentos.
Em meu nome, quero agradecer aos mangabeirenses de hoje que não se descuidaram da memória dos de ontem, inclusive a do meu pai, colocando-o em evidência, para que tivesse a Praça, por ele criada em 1947, o seu nome; quero agradecer ao seu afilhado José Valdécio da Paixão, ou Valdécio de Davino, o empenho pessoal em catalisar este sentimento dos mangabeirenses, levando-o à Câmara Municipal de Itabaiana, e ao prefeito Valmir dos Santos Costa, e denominar a mesma praça com o nome de Alexandre Frutuoso Bispo; agradecer ao vereador João Cândido Sobrinho, propositor na segunda mais antiga Casa Legislativa do estado, e quadragésima sétima mais antiga do país, de tal honraria; agradecer a todos os vereadores votantes ou não, presentes ou ausentes, em uma ou nas duas sessões necessárias à aprovação da matéria; enfim, mais uma vez agradecer ao prefeito Valmir dos Santos Costa pela sanção da lei que denomina doravante a Praça Alexandre Frutuoso Bispo do povoado Mangabeira.
Muito obrigado!

José de Almeida Bispo
Radialista, publicitário, pesquisador, documentarista e historiador.
Membro da Academia Itabaianense de Letras, cadeira 26 (patronesse, Maria Thétis Nunes)

sábado, 29 de março de 2014

Tonho Oliveira, o comunista romântico.

Hoje pela noite, tivemos a recepção ao acadêmico José Luciano Góes Oliveira na Academia Itabaianense de Letras. Discursos afinados, tanto o do apresentador, Vladimir Souza Carvalho, quanto o do próprio. Este discorreu sobre toda a História recente de Itabaiana, vivida por ele, numa forma brilhante de contextualizar o mundo herdado dos tempos do patrono de sua cadeira, Jose Ademar de Carvalho. Nestas idas e vindas, com perfeita maestria, o confrade tocou numa figura mais que grata de Itabaiana, a qual eu tive o prazer de conhecer: Tonho de Doce, ou, Tonho Oliveira, filho de Zezé da Requinta e D. Doce, que tem ainda o Paulinho de quem também tenho a satisfação de compartilhar sua simpatia e grande amizade.
Terça-feira, e não na segunda, dia 31, como tem insistido os envolvidos “culpados” da ditadura que por 21 anos envergonhou o país (os demais, os que lucraram alto, simplesmente buscam sonegar que participaram), completa meio século de um triste capítulo de nossa história. Não tolerando mais perder eleições por absoluta incompetência eleitoral, a direita - os que perdiam desde 1932 - trabalhou e conseguiu impor ao país a sua democracia sem povo. Um dos motes preferidos foi o fantasma do comunismo. Quando se analisa à luz da razão, senão estúpidos, foram de uma maldade ímpar, os que usaram desse artifício pra mergulhar o país num regime onde não tardou partir pra torturar e matar indiscriminadamente. 
Em mais um brilhante artigo, o médico José Marcondes teceu ontem no grupo Itabaiana Grande do Facebook (aqui, para quem tem Facebook) sobre suas viagens ao mundo dos selos e estampas outras, inclusive dos países da Cortina de Ferro, o que deu em dores de cabeça para Seu Afonso, pai do então garoto Cleidnadjo Araújo, nosso Dadá, e um dos seus vários colegas nas aventuras filateliais. De fato, eram assim, em sua esmagadora maioria, os comunistas, não somente de Itabaiana, mas de Sergipe, e do Brasil. Ao falar hoje à noite sobre a militância comunista de Tonho de Doce, Luciano Oliveira não esquece que Tonho era admirador, acima de tudo, da civilidade que o socialismo transparecia. Culto, estudioso e inteligente fazia questão de sair do trivial e ir buscar na literatura socialista as respostas pra muita coisa. Todavia, era comerciante, católico fervoroso, razoavelmente conservador no que toca à família, à propriedade e ao Estado, e, mesmo depois de preso arbitrariamente como o foi em 1964, em seguida à sua liberação mudou-se para Aracaju onde, além de se manter no comércio, “se envolveu com a nobreza”: sua loja de bicicletas ali fundada tinha o nome de fantasia de “O Rei das bicicletas”. Este é o verdadeiro perfil, em geral, do temível revolucionário comunista alardeado pelos perdedores de eleições pra tomarem o poder no tapetão.

sexta-feira, 31 de janeiro de 2014

A incansável luta do ser

Na última quarta-feira, 29, participei de uma reunião aqui em minha cidade, com pessoas conhecidas, figuras carimbadas, como se usa no jargão popular, na arte de ter esperanças e correr atrás da consecução de seus sonhos. Estes, na maioria, tem de serem abandonados, devido aos muros intransponíveis, que costumam erguerem-se diante das ideias humanas; mas, de vez em quando, dão certos; e, a cada tentativa com solução vitoriosa, esta compensa todos os esforços baldados em lutas outras. A reunião em pauta foi sobre o estabelecimento de uma recém-criada ong, a MÃOS AMIGAS DE NOSSA SENHORA DE NAZARÉ, uma ideia da Irmã Luciana Correa Quaresma; mais uma dela, entre nós. Trata-se de uma instituição com vistas a promover a pessoa humana, através de estímulos variados, especialmente a educação profissional, ressocialização, enfim, inclusão.
A Irmã Luciana Quaresma está com quase 77 de idade. Com vinte a menos, a maioria das pessoas sonha apenas com uma só coisa: aposentar-se; e viver aquilo que acha ser vida de rico, ou seja: nada fazer. Apenas curtir. Pelo currículo dela, bem que poderia se dar ao luxo de aderir a esse tipo de vida, sem prejuízo algum à sua biografia. Começou a trabalhar aos nove de idade em sua cidade natal, Arouca, região do Porto, norte de Portugal, e nunca mais parou. Entrou numa congregação de irmãs franciscanas pra fazer o que todas costumam fazer; mas nunca se contentou em apenas administrar, muito menos em viver uma vida religiosa comum. Seu currículo é fantástico. Seu grande último investimento foi numa comunidade, à época paupérrima, numa espécie de invasão, hoje o populoso bairro de Teotônio Vilela, nos Ilhéus de São Jorge, sul da Bahia, onde fez aquilo que poderia ser sua despedida para a aposentadoria. Quase foi, porque, com um espírito que faz inveja a muitos jovens, cá está ela, mais uma vez, dedicada a criar mais uma instituição, para com ela operar mais trabalhos de formiguinha, na busca de levantar caídos, habituais ou não, por este nosso velho vale de lágrimas. Repito: poderia muito bem se dar por satisfeita; mas o espírito de luta, de trabalho, não cessa. Há hoje na cidade, e em quase todo o país, uma plêiade de instituições e pessoas a prestar assistência, numa rede de seguridade que faz inveja a muitos países ricos. São pessoas, que, de alguma forma, dedicam-se no servir. Mas são diferentes no modo de agir como age Irmã Luciana. É louvável o trabalho de asilos a deficientes, idosos, a assistência em geral, sem esquecer os bem vindos programas assistenciais do Governo. Mas, em geral, todos administram recursos líquidos e certos. Asilos, em geral, trabalham com aposentadorias ou pensões dos seus internos ou mesmo externos, pagas pela Previdência Social. Não se trata de um paraíso; mas, ao menos no quesito finanças, não tem do que reclamar. O trabalho da Irmã Luciana é diferente. É promoção humana na sua forma mais elementar possível. Pegar o caído, o desesperado, o indiferente, porque miserável crônico, o que absolutamente nada tem, e buscar, através de atos simples, como aprender um ofício, um caminho de soerguimento na luta pela vida. Despertar. Induzir a dar o primeiro passo. Óbvio que neste caminho ela abraça todos os recursos, pedagógicos ou financeiros, desde dar alimento a quem tem fome a encaminhar até a aposentadoria ou outro modo de recepção de benefícios por parte do poder público; desde a doação em forma de serviços prestados por um humilde servente de pedreiro, à verba que o parlamentar venha alocar em nome de sua instituição; mas, a única condicionante que realmente tem importado no seu trabalho é a existência da matéria prima: o necessitado de ajuda. Os meios? Corre-se atrás. Daí em diante, vem as demais condicionantes no executar desse árduo trabalho, como a exigência firme do beneficiado não desistir; a firme vigilância para não deixar-lhe desviar do caminho; e, claro, certo nível de exigência por resultados.
A ong está fundada e já em atividade. E sua inspiradora impaciente porque ainda não abriu nenhum curso profissionalizante; ainda não conseguiu se organizar pra ajudar alguém a ter seu cantinho, sua casa, trabalho que atualmente está mais facilitado pelas políticas públicas existentes, mas, que, se não houver quem bem conduza, não acontece. Enfim, depois de quase 50 anos de experiência em promover vidas, e o natural reconhecimento sobre tempo de plantio e maturação de ideias, percebe-se nela, aquele vigor adolescente de quem quer tudo e agora. Aos 77.  Recentemente ganhou um terreno da Prefeitura para construir sua sede; mas não tem um centavo em caixa pra isso. De fato, a reunião da última quarta foi para que a arquiteta, que está a desenvolver o projeto da construção, o apresentasse. Mas, em se tratando da Irmã Luciana, é natural que dela se espere atropelar alguns processos para logo meter a mão na massa. Ir ao foco da necessidade. Nasceu pra isso. Ser assim. E que ninguém a tente segurar; convencê-la de que já fez o suficiente; de que agora isso ou aquilo. É da natureza dela. E onde houver gente necessitando, pedindo ou não, ela irá intervir.
Que Deus a ajude em mais essa jornada!