sexta-feira, 30 de junho de 2023

JOÃO MARCELO E A FESTA DO MASTRO.

 

João Marcelo, fora do carro, com Luiz Gonzaga, o Rei do Baião; Dominguinhos, ao volante; e Anastácia, junto com outro artista no banco traseiro. À direita, santinho pós-morte.

“Eu fiquei tão triste, eu fiquei tão triste naquele São João; porque você não veio, você não veio alegrar meu coração” (Antônio Barros e Cecéu, Brincadeira na Fogueira)

 

Neste São João, mais uma vez tivemos menos festa; ao menos a do Mastro. Com registro fotográfico por Miguel Teixeira da Cunha em 23 de junho de 1908, mas que de origem desconhecida. Talvez de desde os tempos do Segundo Reinado; talvez até herdada do Tabuleiro do Caboclos, muito depois de provável aldeia boimé, e muito antes do depois, Bairro São Cristóvão.
Já a continuidade da festa, mesmo frente às modernidades das décadas de 1950, 60, e 70, só foi possível graças a têmpera 'moitchapan' de João Oliveira, popular João da Macela ou João Marcelo(*), que a segurou
, liderando por pelo menos quatro década seguidas, com ou sem ajuda da administração municipal.
Em recente crônica, meu confrade na Academia Itabaianense de Letras, o médico Dr. Luiz Carlos Andrade traduziu com perfeição o que significou aquela festa popular, profana, numa cidade até então só dedicada ao trabalho e as atividades sacras da matriz de Santo Antônio e Almas. Não só no imaginário infanto-adolescente como no adulto; repito, numa cidadezinha em que não acontecia quase nada.
João Marcelo nasceu no dia 12 de maio de 1912, e provavelmente não esteja entre os garotos, alguns trajando o odiado mandrião das fotos de Seu Teixeirinha. É que segundo o fotógrafo e pesquisador – além de outro monte de coisas – meu também confrade na supradita Academia, Robério Santos, a última foto de Seu Teixeirinha foi o desgostoso e revoltado registro do pomposo Mercado Municipal “Cabaú”, derrubado em janeiro de 1919, logo após a morte de Manuel Batista Itajaí, a mando do Coronel Sebrão (José Sebrão de Carvalho, tio). João Marcelo aí tinha somente seis anos de idade, e provavelmente ainda não tinha essa liberdade de entrar em festa alguma.

Festa do Mastro, entre 1900 e 1908, na Rua das Flores (atual Mal. Floriano Peixoto), tomada a partir da início da Rua do Sol (atual General Valadão). Observar o garoto, à esquerda, trajando mandrião branco.

Desconhecemos qualquer registro sobre a continuidade da festa nas décadas de 1920 e 30; mas, no início dos anos 1940, ela passa a ser registrada normal e seguidamente.
Em 1970, com a mudança de fonte do mastro, símbolo da Festa, das matas da Fazenda Grande para as matas do Poço das Moças, hoje Parque Nacional da Serra de Itabaiana, eu, garoto de dez anos vi com meus dois olhos e me encantei com a passagem de volta do cortejo, movido a som de pífanos, caixa e zabumba no Rio das Pedras, onde hoje se localiza os triplos quebra-molas.
Porém, em fins dos anos 70 a festa começou a minguar, à medida que também entravam os modismos da TV, e o velho 'moitchapan' mais envelhecia. Até que na segunda metade da década de 1980 ficou semi-mobilizado.

João Marcelo, sentado, ao centro, atrás do pandeiro, 23 de junho de 1944.
A família e amigos ainda tentaram dar uma energiazinha; mas insuficiente diante da avalanche de festas e outros entretenimentos. Ao menos neste século atual, não me consta que tenha sido de novo tentada. Desde 1999.
João Marcelo de Oliveira faleceu em 09 de julho de 1991, depois de uma vida exemplarmente profícua, e descansa, sepultado no Cemitério de Santo Antônio e Almas de Itabaiana.
Coincidentemente, a Câmara Municipal de Itabaiana o homenageou com o nome de uma praça, próxima à primeira fonte de seus mastros, no Conjunto José Luiz Conceição, do mesmo Bairro São Cristóvão onde provavelmente nasceu a Festa do Mastro.
 
À direita, em 1988, já alquebrado pelos anos assiste os heroicos brados de resistência de amigos e familiares, que cessariam em 1999. Na foto preto e branco, um dos primeiros taxistas de Itabaiana, no início de década de 1940.


(*) Macela, nome de planta – e não Marcela, nome feminino italiano – é o riacho desaparecido sob a atual cidade, e cuja parte visível, em verdade hoje é o açude. O Marcelo, de João é a conversão do seu apelido toponímico “Macela”.

quinta-feira, 29 de junho de 2023

IBGE CONFIRMA: ITABAIANA TEM A TERCEIRA MAIOR POPULAÇÃO DE SERGIPE


 

A publicação ontem do consolidado do Censo 2022 confirmou Itabaiana como o terceiro município mais populoso no estado de Sergipe.
A posição foi disputada com o município de Lagarto que, desde 1940 sempre ficou com o segundo lugar, atrás apenas da capital; só recuando para o terceiro em 2000, com a disparada de Nossa Senhora do Socorro, já convertida em cidade-dormitório de Aracaju. Já Itabaiana, perdeu o terceiro lugar ainda em 1991, quando a mesma Socorro lhe ultrapassou. Desde então, ficando em quarto lugar nos censos de 2000 e 2010. 

A maior população municipal de Sergipe

Desde que foram criados, os maiores municípios sergipanos foram Santo Amaro das Brotas, em primeiro; Lagarto, em segundo; e Itabaiana em terceiro. Todos eles emancipados no mesmo dia 20 de outubro de 1697(*).
Santo Amaro, 30 anos depois foi reduzido com a criação do município de Neópolis, que, com a Santa Luzia do Itanhy e os três primeiros citados, além da capital, São Cristóvão, atravessaram todo o período colonial do século XVIII.
Já sobre os mais populosos, antes do Segundo Reinado, quando as coisas finalmente tomaram prumo no recém independente Brasil, os números são duvidosos.
Em 1775, o super secretário real, Marquês de Pombal ordenou um levantamento geral da população no Brasil, o que foi feito até a Proclamação da República pelas paróquias.
Aos números: São Cristóvão, a capital, tinha 4.367 habitantes; Lagarto, tinha 4.064 habitantes; Santa Luzia do Itanhy tinha 1.786 habitantes; Itabaiana e Santo Amaro das Brotas, apenas 1.013 cada; e Neópolis, 2.031 habitantes.
Em 1775, pela ordem, o maior município era Neópolis; depois Lagarto; Itabaiana; Santo Amaro; Santa Luzia e São Cristóvão.
Um novo censo, muito mais confiável, só vem a ocorrer em meados do século XIX, com a província de Sergipe com quase o triplo de municípios.
Em 1851 Itabaiana era o município mais populoso de Sergipe, com 18.957 habitantes. Capela com 18.448 era o segundo; São Cristóvão com 15.586, o terceiro; e Lagarto, com 15.549, o quarto.
Já em 1857, dois anos após a primeira e maior epidemia de cólera, que estatisticamente matou ao menos 4 em cada 10 sergipanos, Itabaiana era o segundo, com 7.879 habitantes, atrás de Propriá, o primeiro, com 8.518; Capela, o terceiro, com 6.761; e Lagarto, o quarto, com 6.520 habitantes.
Observando que Capela e Lagarto sofreram desmembramento com emancipações de parte do município anterior. Por isso a queda maior.
Em 1890, Itabaiana era disparadamente o mais populoso com 28.272 habitantes. À frente de Propriá, com 19.257, e Aracaju, com 16.336.
Mas, com os desmembramentos corridos entre 1874 (Riachuelo) e 1933 (Ribeirópolis) a população municipal de Itabaiana encolheu severamente, ficando atrás da capital e de Lagarto até 1980, sendo ultrapassada por Nosso Senhora do Socorro, em 1991. E só agora reagiu positivamente; não somente segurando os nascidos entre 2010 e 2023, mas a estes acrescentando quase sete mil migrantes que se mudaram para a cidade.
Agora, sim, pode-se dizer que cidade progrediu; não apenas teve um crescimento fraco.

(*) Data corrigida. Tinha sido sido postada com ano anterior.


segunda-feira, 26 de junho de 2023

PERSONAGENS DE UMA REVOLUÇÃO NÃO ANUNCIADA.

 

O meu engraxate, em 23 de junho de 2023; e o engraxate de Louis Daguerre, em 1838 (detalhe de foto maior, abaixo)

Uma história leva a outra; que leva a outra... e a um fantástico mundo.
Sexta-feira, 23, véspera de São João, de repente, ao tomar meu cafezinho, já de adiantado papo com os amigos eis que passa um jovem engraxate, uma raridade nestes tempos, já quarentões no uso de tênis ao invés do sapato.
Eu, por questão de economia só ando de roupa ‘social’: calça, camisa e sapato, naturalmente. Mudei de hábito, ainda jovem depois do saudoso amigo Adelardinho Jr, colega de cachaças, de rádio e rock – primeira metade dos 80 – então lojista de confecções me lembrar que a calça jeans stone wash que acabara de comprar custava que uma vez e meia o valor da calça social chique que também estampava na sua vitrine; e que o tênis que eu estava então usando, custava quase duas vezes o sapato social da onda, o Monza da Samello.

Um boulevard vazio, sem nenhum movimento, e Daguerre aponta sua precária lente, para o espaço vazio, buscando aquela que foi a primeira imagem fixada por processo de interação físico-química. E eis que depois percebe, num cantinho - esquerdo, embaixo - um detalhe: havia um engraxate ganhando um troco lustrando o sapato de um também solitário cliente. As duas primeiras criaturas vivas e eternizadas na fotografia. Os faraós do Egito dariam tudo para serem eternizados assim.

Mas, voltando ao engraxate, ao usar-lhe os prestimosos serviços eu o fotografei em ação.
Nem lembrei na hora; mas, as primeiras pessoas a aparecer numa fotografia, de 1838, feita pelo próprio Louis Daguerre – inventor da fotografia - e seu daguerreotipo, felizmente logo renomeado para câmera fotográfica, foram um engraxate e seu cliente, num boulevard parisiense.
Nascia ali algo realmente revolucionário. Dali veio o cinema, a TV e toda a parafernália de uso da imagem, como as atuais câmeras de celular.
A fotografia está na notícia, no documento, nas ciências, como a antropologia, a geologia, a história, a biologia, a física, etc.. É impossível nos dias atuais, imaginar-se a sociedade sem a imageria.
A minha homenagem ao engraxate de sexta-feira, dia 23. Sem o saber, nos protagonizamos aquela que a cena mais emblemática da nossa civilização atualmente.

Por volta de 1890 Miguel Teixeira da Cunha, literalmente "picou a mula" para Salvador. Foi buscar sua câmera com a qual registrou raras e preciosíssismas cenas da antiga e estagnada Itabaiana. Como presente, se deu e a nós essa maravilha da Praça Fausto Cardoso e sua imponente matriz de Santo Antônio, responsável pela cidade não ter acabado, de tão parada que era.



domingo, 25 de junho de 2023

214 ANOS DEPOIS.

 

Decididamente, não era a carne de carneiro. 214 anos depois, e as mulheres de Itabaiana continuam entre as mais fecundas do estado. Apesar da enorme redução no número de filhos, dos 15 em média, de até meio século atrás, para menos de 2 em cada vida reprodutiva ativa atual.
Em 1808, o já bispo de São Luiz do Maranhão, D. Marcos Antônio de Souza publicou uma pequena História de Sergipe, intitulada Memórias da Capitania de Sergipe, onde traça um panorama geral do que era a já pequena capitania, formalmente uma mera comarca da capitania da Bahia, mas que se manteve viva até 1820, ganhando finalmente o status, não mais de capitania; mas de província do novíssimo Império do Brasil; este, recém emancipado de Portugal, em que pese ainda hoje se manter caudatário de império anglo-americano.
Sobre Itabaiana, D. Marcos narrou que suas mulheres eram exímias tecelãs, a fabricar panos rústicos que seus maridos vendiam de feira em feira. E que pariam muito; muito mesmo. Narra o clérigo que se comentava à época que era devido a muito se alimentarem de carne de carneiro; e que essa carne consumida acabava por mexer com a fertilidade das nossas matronas.
Bem, carecemos de estatísticas cm que ao menos tenhamos os indícios que norteiem uma pesquisa dentro do assunto; mas que as mulheres de Itabaiana continuam como em geral as mais férteis no estado, os números do SUS e do IBGE não negam.
Mesmo ainda não dispondo dos números finais do Censo 2022, uma ligeira análise de 1996, 2000 e 2010 já nos cacifa para afirmar que, a produção geral de meninos continua a cair em todo o Brasil, Itabaiana inclusive. Aqui, porém, os números de nascimentos são cerca de uma vez e meia a média nacional e a média estadual, entre as duas.
Logo, D. Marcos Antônio de Souza continua atual, 214 anos depois, mesmo que a carne de carneiro e ovelha, definitivamente não seja responsável.