segunda-feira, 9 de junho de 2014

A única saída.

Desde sua Independência, em 08 de julho de 1820, que Sergipe vive a saga da democracia sem democratas. Vieram os partidos dos camundongos e rapinas que se digladiaram até o fim do Império; e, em seguida, pebas e cabaús mantiveram a mesma rota. Depois udenistas e pessedistas e seus atuais sucedâneos. A existência da polaridade, coisa normalíssima e salutar em qualquer estado, em Sergipe, reveste-se de uma peculiaridade ridícula, que é o coronelismo. Os grupos tem se mantido com razoável união, graças ao instituto do coronelismo. A política estadual nasceu assim, com José Matheus da Graça Leite Sampaio de um lado e José Acioly de Barros Pimentel do outro. O desaparecimento de ambos deu na substituição por outros, sempre. Manteve o status quo. 
Nunca na história de Sergipe houve a formação de um grupo, coeso, democrático internamente e de propostas desenvolvimentistas. A História de Sergipe está repleta de individualismos e brigas encarniçadas pelo poder pelo poder. Todos os momentos de progresso do estado deveram-se a intervenções externas. Todos. Inclusive na administração do Estado. A fórmula criada no Império mostrou-se quase eficaz: um presidente – e às vezes outros agentes administrativos – nomeado diretamente pelo Imperador, em pessoa de sua inteira confiança, preparado tecnicamente, razoavelmente isento das querelas e mesquinharias paroquiais; para dar um viés democrático, até seis vice-presidentes – às vezes até o terceiro assumiu, temporariamente - porém, sem força política acima das diretrizes imperiais. A segunda grande intervenção veio com o estabelecimento da cultura do algodão que livrou o estado da monocultura açucareira, criando, assim, um mínimo de diversidade. Desde então, às crises internacionais do açúcar, houve a resposta do setor cotonicultor, constituindo estes dois setores, nas duas alavancas ao desenvolvimento que levou Sergipe a ser o segundo estado mais industrializado do Nordeste em 1910, e o oitavo no país. Tão logo o Estado de Sergipe se consolidou, saindo de debaixo do Governo da Bahia a quem pertencera completamente de 1759 a 1820, e na prática e parcialmente, desde 1590 a 1757, houve sensível progresso na então província. Isso em nada teve com a possível ideia progressista de suas elites, enfronhadas, unicamente, na ideia de manterem seus privilégios na máquina pública, e os contratos de entrega de açúcar, que os deixavam em dia com banqueiros, que, de fato, foram os grandes beneficiários dos lucros fáceis da escravidão. Observa, com propriedade, a historiadora Maria Thétis Nunes, que foram os pecuaristas, e não os senhores de engenho de Sergipe, os responsáveis por todas as grandes transformações que houve no estado; até mesmo a sua Independência. Sempre dependemos “do homem”. Aquele que, com seu sacrifício, sempre e inicialmente na vã ilusão de obter vantagens, bem ou mal, tem conduzido o estado. Até ser substituído.
A Revolução de 1930 modificou muita coisa no país. Em Sergipe, muito pouco. Os novos atores durante o período revolucionário, especialmente durante o Estado Novo, não passaram de coronéis, com nova roupagem, a tentar se imporem; sem muito sucesso, porque apolíticos. No ressurgimento da democracia, a partir de 1946, criou-se a figura de transição, do burocrata, desenvolvimentista, bem ao gosto do Nacional-Desenvolvimentismo, jovem, egresso da velha elite, na sua parte mais poderosa. Não demorou e a briga intestina do velho senhorio de engenho restabeleceu os tempos de chumbo de camundongos e rapinas, pebas e cabaús, até que o Golpe de 1964, apoiado por ambos, gerasse mais um hiato nas tensões. Estas, contudo, se mantiveram latentes, nem sempre preservando o armistício; apenas contidas pela intervenção do poder central do país. O retorno à democracia, iniciado antes mesmo do fim do regime de 1964, muito prometeu. Pela primeira vez, um homem totalmente do povo, ocuparia o poder central. Coincidentemente, tutelado pelo mesmo agente transformador da outra abertura política, 36 anos antes, o novo governante era a cara do povo; seria o fim de um sistema que transformou um estado pequenino, facílimo de administrar, numa das mais intricadas porções de terra deste país, tais os interesses espúrios arraigados, de gerações secularmente nutridas pela máquina pública. Não deu! No segundo ano, depois de dois de intensos tiroteios, traições dentro da máquina, reformulação das panelinhas ou fortalecimentos delas, na mesma; negociatas impostas pelo Legislativo no melhor estilo rapina e camundongo, o Governo foi às cordas, num escândalo armado com a imprensa nacional. E desde então, foi um correr atrás de prejuízos sem fim. Em 1986, correu-se o risco, inclusive, de aborto na retomada dos investimentos, de fato iniciados em 1977. Num momento delicado da política nacional, com a República acéfala, já que havia apostado todas as suas fichas “no homem” Tancredo Neves, falecido antes da posse; com a volta da política em toda a sua dimensão, inclusive na corrupção, de que de fato nunca se afastara, mesmo nos anos de suposta administração “técnica”, dos militares, o quadro era preocupante. A solução não poderia ter sido melhor: um homem público para administrar o que viria a seguir. Nada de super-herói; do cara sabe tudo, resolvedor; mas, um político. Na mais fina acepção da palavra. Conduziu com maestria um estado e um Estado carcomido de vícios seculares e de tudo o que disso possa advir. Abriu mão de permanecer no primeiro time em nome de uma conciliação extremamente necessária naquele momento. Tranquilamente retornou ao centro quatro anos depois onde ainda hoje permanece. Participou de mais uma tentativa de mudança na política do estado, nunca titubeando na sua função, ora de bombeiro, ora de escora, até mesmo de oráculo. O que veio a seguir ao fim de seu governo, foi o acirramento das posições beligerantes entre os grupelhos em disputa pelos quinhões dentro da máquina pública; que não deu trégua, sequer ao homem mais poderoso do estado, porque o mais rico, quando no comando do Governo. O ápice desta guerra movida contra o Estado e seu homem de comando ocorreu com o trágico desaparecimento da última esperança, em termos de novidades, dos últimos 50 anos: Marcelo Déda Chagas, morto por um câncer; mas, antes, abatido, de joelhos diante de uma sociedade manipulada pelos que vivem com a cabeça em 1800.
A democracia é o pior dos regimes, exceto todos os outros. A afirmação de Winston Churchill é inquestionável. E a grande vantagem da democracia é a possibilidade que temos, de consertar tudo, a cada quatro anos. Nada se compara a isso. Homens aparecem e desaparecem. As sociedades, também;  em que pese viverem e permanecerem, de um modo ou de outro, por algum tempo mais. Dependem deles, pois, que, como ganho, a única vantagem de que dispõem é o reconhecimento pela História, contada e estudada pelas gerações futuras. Claro, seus descendentes próximos, no máximo até a quinta geração, também serão beneficiados; mas é a história que os perpetuarão. Sergipe tem, neste ano, mais uma chance. No plano estadual, o que se verifica é o preocupante avanço cada vez maior da agiotagem sobre o comando do poder; quer nas instâncias menores, os municípios; quer na instância maior, o Estado, e em todas as suas casas legislativas, com cada vez mais gente de condutas questionáveis ascendendo ao poder. Essa agiotagem é criminosa, não somente pelo ato em si, mas pelo que engendra em todo o seu conjunto; já que o crime nunca se compõe de apenas um ato criminoso. O escândalo envolvendo Floro Calheiros (assassinado), Joaldo Barbosa(Nego da Farmácia)(assassinado), e Antônio Francisco Sobral Garcez, não acabou este tipo de crime no estado; em contrário; mais se acentuou e se sofisticou, depois daquela tragédia. Diante da polaridade ora verificada, com nítidas chances de absurda piora no quadro geral do Estado e por tabela no estado, resta-nos a esperança de uma ponte. Alguém que consiga transitar por este mar de vícios, recuperando o máximo possível do que for recuperável; isolando o que não tem jeito, já que sua destruição nem sempre é salutar. E até queimando a erva daninha, irrecuperável.  Alguém que conduza. Ao menos que dê um refresco, por algum tempo. Um político. Só um político, salva Sergipe do desastre que se anuncia. Depois de 50 anos de vai-e-vem... restou Antônio Carlos Valadares; atual senador, PSB. Pessoalmente, ou voto nele, ou não voto em ninguém. O tempo dirá se teremos sorte; se eu estou certo. Mas não vejo outra saída.