domingo, 23 de novembro de 2025

ANTES DE SER CAMINHONEIRO, O ITABAIANENSE FOI VAQUEIRO.

 

Dia 30 de novembro, Itabaiana, a cidade-mãe da pecuária nacional, segundo o que deixou grafado o sargento-mor, Diogo Campos Moreno, em 1612, realizará mais uma Festa do Vaqueiro. 

A data não chega nem de perto a ter o simbolismo do dia 5, do mesmo mês de novembro; mas já é alguma coisa.

Também a festa será muito distante daquelas primeiras apartações, de 1610, 1620, para apurar a produção; pagar os impostos – as fintas; os arrendamentos, enfim, levar as boiadas para Salvador ou para Olinda. 


A fazenda na área do Mandeme preserva traços do encontrado e grafado em mapa, pelos holandeses, em 1637, quando Itabaiana tinha "campos de infinitos gados", conforme tinha dito o sargento-mor, Diogo Campos Moreno, vinte e cinco anos antes; e era o grande centro abastecedor de gado, à Bahia e a Pernambuco, que, praticamente resumia o Brasil, ao nascer.

Certamente no domingo, aboios se ouvirá, como se ouviu há quatrocentos anos; mas não haverá derrubadas, ferradas, etc.. Ao invés disso, cantores do show-bizz, em cima trios elétricos, e nenhum boi na manada.
E será dia 30; não no dia 5. Ou próximo disso.

O 5 de novembro

Um curral natural, cercado de serras, em cuja área, atualmente, cinco municípios se formam dentro das serras, e quatro nas suas fraldas externas. Epicentro, no dia 5 de novembro de 1656, da primeira rebelião contra o abuso de autoridade na história da formação brasileira.

E porque insisto em falar sobre o simbolismo do dia 5? 
O cercado natural de serras, se encheu de gado, tão logo veio a Conquista de Sergipe, oficializada em 1º de janeiro de 1590. 
Era seguro, apesar de próximo do mar; fica a 300 km (em linha reta de Salvador); e 400 de Olinda. Quase no meio do caminho entre os dois grandes centros. Olinda - leia-se Pernambuco - cheia de dinheiro do açúcar; Salvador, a capital da Brasil, seu Recôncavo, e suas imensas frotas de caravelas, necessitando de milhares de cordas de couro de boi; e couro para embalar o fumo que levavam para a África e Índia. Além do monte de marinheiros, famintos por carne do sol.
Em 1600, sob o império espanhol, abarcando quatro dos cinco continentes, o curraleiro, criador arrendatário das terras, praticamente não pagava imposto. Mas em 1650, depois de consolidar a Restauração do domínio português as coisas mudaram. Para pior.
Teoricamente, Sergipe era independente do governo baiano; mas todo ano Salvador vinha cobrar imposto, que também tinha de ser pago a São Cristóvão, a capital de Sergipe, e por ele responsável. 
O imposto se tornou extorsivo; e aí, num claro ato de desespero, para chamar a atenção de Lisboa, o próprio governador de Sergipe, criador arrendatário em Itabaiana, Capitão-Mor Manuel Pestana de Brito (Teria vindo daí “o Campo”?) liderou a primeira revolta contra o governo no Brasil: a Rebelião dos Curraleiros, em 5 de novembro de 1656.
Foi um desastre! 

Abuso na cobrança de impostos levou ao desespero, resultando em rebelião que envolveu até o governador Pestana de Brito.

Foram presos o governador, Pestana de Brito; vários vereadores em São Cristóvão, todos criadores de gado em Itabaiana; enfim, cerca de cem proprietários tiveram suas vidas afetados – e afetaram a produção por anos – sendo que somente seis anos depois os processos, na maioria irregulares e até criminosos foram jogados na lata do lixo. E queimados para não deixar provas dos abusos. E Sergipe passou desde então a ser verdadeira colônia de Salvador.
Logo, quanto tilinta um chocalho; ou alguém solta um aboio, fatos históricos recém revelados nas pesquisas do Programa de Documentação e Pesquisa Histórica, do Departamento de História da Universidade de São Cristóvão, conduzidas pela itabaianense Maria Thetis Nunes e seu parceiro, Lourival Santana Santos, me reavivam a memória da grandeza sonegada ou ignorada do meu lugar.
Viva mais uma Festa do Vaqueiro! 
Quiçá, um dia, se amarre festa, à magnânima data da sergipanidade. A meu ver, a maior. Nascida sob heroísmo real e sofrimento. 
Há 16 anos que tento. 
Um dia sai.