sexta-feira, 28 de novembro de 2008

Nó górdio.

Um amigo meu, apontado como participante da futura equipe de trabalho da próxima gestão Luciano Bispo conseguiu me arrancar algumas gargalhadas ao sinceramente confessar: “não gosto de pagar imposto. E quando posso...” Conclusão da minha parte: ao menos neste setor já identifiquei uma pessoa bem colocada. Só sabe pegar sonegador quem sabe como sonegar.
Cobrar impostos em Itabaiana nunca foi tarefa fácil. A primeira rebelião política não indígena no Brasil contra o governo português ocorreu exatamente aqui, quando o Capitão-Mor Pestana de Brito (depois José Rabelo Leite) e o Ouvidor-Mor Bento Rabelo vieram cobrar os impostos do gado(*). Mesmo depois dos ataques holandeses à Itabaiana era aqui ainda o importante centro de criação de gado do Brasil e o lugar onde era mais fácil de ser o imposto cobrado. Dessa confusão nasceria tempos depois o município de Simão Dias, sob o nome do principal rebelde.
Durante dois séculos a sede municipal não passou de uma miséria só, haja vista que não havia feira ou outro tipo de comércio regular, e das atividades econômicas de então ninguém cobrava nada. Somente com o advento da República e simultaneamente a liderança de Batista Itajaí é que o município começa a cobrar algum imposto e seus frutos começam a aparecer timidamente. O apogeu deu-se com um comerciante de tez dura e força pessoal capaz de impor: Antonio Dutra de Almeida. Foi ele quem fez a primeira bateria de benefícios à miserável cidade que de tão miserável continuou sendo chamada pelos roceiros de vila. Dutra era temido, logo, detestado.
Por fim os impostos produzem a grande tragédia. É a sua cobrança o fermento da fúria exacerbada da oposição que leva, juntamente com a conspiração dos coronéis da política sergipana, ao desfecho de 08 de agosto de 1963, com a morte de Euclides Paes Mendonça e seu filho Antonio de Oliveira Mendonça. Euclides, o maior político de Itabaiana dos tempos republicanos até aqui, herdou uma situação privilegiada e ao mesmo tempo explosiva na arrecadação de impostos. Em 1952 passou a vigorar o dispositivo constitucional que colocava o IIP - Imposto de Indústria e Produção, correspondente ao ICMS atual - nas mãos das prefeituras. Estas, como não tinham estrutura para a cobrança, contratava a fiscalização do Estado mediante repasse de vinte e cinco por cento. Enquanto o governo do Estado foi responsável, ou do lado de Euclides, as coisas funcionaram, apesar da panela de pressão que cada vez mais ficava instável. Com a subida ao poder de Seixas Dória em 1962, este cortou os convênios com a Prefeitura de Itabaiana levando esta a realizar a cobrança por si própria. Como resultado, a criação de um corpo de fiscais próprios e ressurreição da então inexistente Guarda Municipal, já que ninguém cobra imposto – e é bem sucedido - sem mostrar que não está pra brincadeira. Duas polícias, na prática. Provocações, tiroteios, morte e a grande tragédia que abalou o país.
Meu amigo vai ter que dar nó em pingo d’água. E nem pode ir pela solução de Alexandre, o Grande: simplesmente cortar o nó górdio.
(*) As cobranças visavam "fazer caixa" para pagamento das dívidas contraídas durante a guerra de independência de Portugal contra a Espanha, principalmente com a Inglaterra. Na ocasião Portugal casou uma princesa com o rústico rei inglês na vã esperança de que o mesmo se convertesse ao catolicismo e cuja rainha teve o pomposo nome de Sereníssima Rainha de Paz da Inglaterra, Escócia e Holanda. A coitadinha foi abandonada em plena fria Londres até que decidiu terminar seus dias em Portugal. Seu condutor de volta, João Manuel do Cabo, ganhou de presente de Sua Magestade, pelos favores prestados o primeiro cartório de Itabaiana em 02 de setembro de 1700, o atual de segundo ofício (Cartório de Maria Helena).