terça-feira, 15 de dezembro de 2009

Neste ano eu não vou receber "o" cartão

Quem souber dizer a exata explicação/Me diz como pode acontecer/Um simples canalha mata um rei/Em menos de um segundo
Beto Guedes, in Canção de um novo mundo


Todos os anos, com uma regularidade impressionante eu recebia pelo natal um cartão de Boas Festas.
Não tenho costume de receber muitos cartões. Também, menos ainda tenho o hábito de enviá-los. Nos meus tempos de carteiro – e lá se vão 27 anos disso – sequer os mandava pra alguém. Talvez “poluído” de tanto cartão que tinha de entregar por dever de ofício.
Mas voltando ao cartão especial de que me motiva deitar estas mal traçadas linhas, o cidadão que fazia questão de ir até a minha casa levá-lo, de próprio punho, a meu ver, nada tinha de especial a me tratar. Fora o fato de uma sua irmã ter sido minha professora de português por um ano, no longínquo 1975, nada. Nunca joguei na quadra que ele administrou desde que Dr. Mazzae Lucas saiu daqui; nunca assisti ou joguei no time que sustentou mediante negociações exaustivas e insistentes – e como era insistente e persistente, aquele rapaz! Diplomata fino; pra nenhum Celso Amorim botar defeito - pra conseguir-lhe recursos, enfim, nada havia que fizesse Francisco Vilobaldo de Oliveira, o saudoso Chico do Cantagalo se lembrar de mim na hora de distribuir cartões de Boas Festas em nome do Cantagalo Futebol Clube, salvo uma conversa que tivemos na banca de jornais de Gilson, quase em frente à sua quase centenária casa, na Praça Fausto Cardoso, quando a dita banca foi ali instalada. Desde então, todos os anos, um suado, ofegante e lutador Chico do Cantagalo subia até a Rua São Luiz para deixar em minhas mãos, ou sob cuidados da minha esposa, a lembrança de mais um ano de amizade. Sem falha.
Isso não mais ocorrerá. Alguém adoecido pelos chamados Pecados Capitais, corroído de usura que é mãe da inveja, que é a ideologia de todo ladrão, num ato de desatino total feriu Chico de morte. Foi morto depois, mas, o que importa isso?
Neste ano não tem mais cartão de Chico do Cantagalo. Nem mesmo do Cantagalo que, acredito eu, ser impossível viver sem Chico.
Perdas. De fato, uma das piores coisas que acontece ao ser humano.
Pelo menos os últimos três já estão na minha galeria de papéis antigos. Tem gente que é assim mesmo: meio besta.