terça-feira, 22 de julho de 2008

Qui prodest?

Segunda-feira. Septuagenária, “sem pedigree”, tipo "latino-americana sem parentes importantes e vindo do interior", busca num posto de saúde uma extração de uma unha que em seus pés calejados de agricultora, contraiu de há muito uma micose deformando-a, e fazendo-lhe passar sérios incômodos. Atendentes do posto de saúde a despacham com a recomendação de buscar pelo Hospital já que no dito posto não há nenhum médico que faça a pequena cirurgia. Quarta-feira, manhã, a nossa septuagenária, depois de caminhar por mais de um quilômetro e meio pelo pior passeio público do mundo (ela tem recomendações médicas para caminhar) chega ao Hospital. As demoras de praxe no atendimento em serviço público de saúde e, depois de algumas incertezas provocadas por funcionários mal treinados, mal pagos e até mal educados eis que uma atendente explica-lhe: “Só com a Dra. Tereza. E ela só vai estar aqui à noite. A senhora pode vir que ela lhe atende.” Sete da noite e a nossa septuagenária, que tem todas as garantias de um tal de estatuto do idoso, chama um táxi (pela noite, definitivamente não dá para encarar as calçadas - ditas passeios públicos – verdadeiras armadilhas para quedas, de Itabaiana). E lá se vai a nossa septuagenária senhora em busca de resolver seu problema de unha encravada. Apresenta-se na recepção do Hospital e lhe mandam aguardar. Algum tempo depois um funcionário avisa: “a doutora Tereza chegou. Quem vai pra ela?” A nossa personagem se reapresenta, faz uma ficha e aguarda. Tempos depois um funcionário com cara desses que assumiram o emprego por ser “amigo” de alguém despacha: “a doutora Tereza não extrai unhas”. A senhora ainda inquire: “e quem o faz?”. A resposta, “aqui, ninguém!” Só no Posto da Feira das Panelas. Sexta-feira, manhã, Posto de Saúde José Souto Diniz, popularmente conhecido como Posto da Feira das Panelas. Nossa paciente (e põe paciência nisso!) tenta mais uma vez. “Aqui, não!” Reponde o atendimento. “A senhora tem de ir ao Hospital”.
Segunda-feira da semana seguinte. A nossa septuagenária, através de uma amiga conhece uma clínica que faz o serviço a preços ao seu alcance. A unha agora jaz em algum lixo hospitalar por aí. E a septuagenária dormiu como um anjinho depois de quase dez dias de pesadas doses de analgésicos, caretas, gemidos e humilhações.
Em tempo: tem título de eleitor e vota desde 1954. Não votará nem sob tortura nesse ano. Tem consciência perfeitamente que está dentro daquela indagação que faziam os romanos: Qui prodest: a quem (ela) interessa?