quarta-feira, 24 de março de 2010

A cesta de alimentos.

Dias atrás, ouvindo a certa distância um papo entre dois jovens na faixa de vinte a vinte e cinco anos, gelei. Não pude ouvir com detalhes sobre o que conversavam, porém deu pra perceber que falavam sobre um ilícito cometido por um terceiro. E o que me fez gelar? O aparentemente mais velho deles relativizou a prisão de terceiro arrolado com a seguinte expressão: “E daí? Vai preso dois dias, contrata o “adevogado” depois fica pagando uma cesta de alimentos e pronto, rapaz! É só tocar o barco pra frente. Só não pode é rodar a cara.” Rodar a cara, na gíria de bandido é bater de frente, com policial e principalmente com bandido mais perigoso. Os jovens em questão, até onde eu saiba, sequer tem alguma passagem pela Polícia; mas usam a mesma linguagem que "seus colegas", estes habituais frequentadores das salas de interrogatório.
Eis o que pensa essa juventude delinqüente da qual participam ou participavam Maria Sônia de Melo, mandante do crime que abateu a vida de Jaqueline Souza Mecenas na última segunda-feira, 22; Ronaldo Mota dos Santos, o assassino contratado, e os dois traficantes, Erivaldo Oliveira e Jaedson Barbosa, mortos em confronto com a Polícia na manhã desta terça-feira, 24 de março(aqui).
Não existe no arcabouço moral dessa gente (se é que existe isso neles) a presunção de punição, de perda, com tais atos, salvo da própria vida. Que também não é valorizada por eles. Eis os monstrengos que criamos em nossa corrida ao ouro; em nossa perigosa jornada ao vale-tudo.
Não vale à pena roubar. Ou entrar em qualquer tipo de criminalidade. Custa muito caro. No mínimo vai ser uma sombra a perseguir o fora-da-lei por toda a sua vida, até a velhice, se a ela chegar, e ninguém gosta de ser chamado de ladrão. Entretanto, a frouxidão com que a sociedade vem tolerando os “bem-sucedidos” do vale-tudo acaba fazendo crer que vale a pena continuar nessa espiral.

A fortaleza.
Sobre a ação de hoje da Polícia, nota dez(mais aqui). Em que pese o perigo representado pelo apelo à resolução fácil da criminalidade através da matança, tá demonstrando que o Estado tem donos. E não são os bandidos seus donos.
A rapidez com foi desvendado o crime que vitimou Jaqueline Souza Mecenas (aqui) enche a qualquer cidadão de bem de orgulho e esperança. Se isto tivesse sido a práxis desde tempos remotos – ao menos desde 1984, quando começou esta escalada maluca – não estaríamos aqui lamentando mais números macabros para a estatística da cidade.
Meu lugar é uma fortaleza natural, cercada de serras o que lhe confere facilidade no controle. Isso já o fazia os índios de Baepeba quando acendiam suas fogueiras de alerta na serra dos montes, ao sul do Campo do Brito pra alertar da presença de invasores na área (a serra chamou-se do Botafogo até quase 1800). Se a área é uma fortaleza natural, jamais me conformarei com o fato de autoridades relapsas e preguiçosas tê-la deixado se transformar num covil. Por isso, parabéns mais uma vez à Força Pública do Estado de Sergipe. Tem de limpar.
Quero voltar a me encher de orgulho com as estatísticas dos montes de feirantes a retornar à terra de Santo Antonio de Itabaiana trazendo o produto de seu suor e dos produtores que lhes forneceu; das dezenas de caminhoneiros a enriquecer nossas ruas com o produto de suas longas travessias nas estradas do meu país, e não da estatística de ladrões de estrada a fixarem registros deprimentes até nas casas legislativas de outros Estados ou de um monte de vagabundos negociando porcaria, servindo de mula pra outros vagabundos maiores a esganar a auto-estima do lugar. Quero voltar a ver famílias morando em seus sítios sem o risco de morrerem pelo crime de trabalhar pelo próprio sustento; de terem o direito de criarem suas galinhas de capoeira, suas vaquinhas, cabras... ter seu transporte, fruto de seu suor, sem esses monstrengos a perturbar. Quero a riqueza real, a mesma que turbinou nosso lugar nos anos 50 e 60, duradoura e enobrecedora porque obtida com nobreza de caráter através do suor do próprio rosto e de suas habilidades de negociadores natos. Quero o fim do covil e a reconquista da nossa fortaleza: a Itabaiana.
Santo Antonio de Itabaiana.